Quando
falamos em leitura sempre nos vêm à mente aqueles velhos e surrados dilemas: “Mas
eu não gosto de ler. Não tenho o hábito...”. Sim, isso tudo compreendemos.
Contudo, esse tal de ‘não gostar’ pode até ser intragável a alguns paladares
menos apurados, mas afirmar com tanta convicção que não é capaz de ler, meus
amigos, é o mesmo que considerar-se, paradoxalmente, incapacitado de existir ou
sentir nem que seja uma leve brisa ao lhe desgrenhar um pouco os cabelos,
exatamente como vemos em funerais antes do corpo descer e esperar transformarem-se
em poeira os fios do cabelo do novo morto.
Acreditem,
senhores, a leitura independe de nossas vontades, pois temos aparelhos
‘ledores’ e isso já vem de fábrica, vem de dentro, vem conosco. Eles são vivos,
servem para sentir a vida, mas a nossa só é capaz de existir se formos capazes
de sentir e deixar-se sentir pelas demais. Sim, falamos de nossos sentidos, todos
eles, sem faltas. Falamos do tato, do olfato, do paladar, da visão e de alguns
outros sensores que vão brotando com o tempo e com experimentações nossas para
com as escritas feitas pelas anotações do mundo e nas páginas de nós mesmos.
A
leitura escrita, contrariando o que muitos tendem a acreditar, não define o
processo de ler, pelo menos não integralmente. Enganam-se os que creem nisso, pois
decodificar códigos gráficos (a escrita tal como a conhecemos no papel) é
apenas uma de nossas muitas capacidades leitoras. Digo mais, esta é uma das poucas
que não nascem conosco, de fato precisamos aprendê-la, jamais nascerá prontinha,
mas uma vez apreendida, ela tende a crescer dentro de todos nós e apurar e
confundir nossos outros veículos ‘ledores’. Sim, elas podem, inclusive, nos
levar até a mais difícil e formidável de todas elas: a leitura de nós mesmos.