Toda
vez que penso estar livre. Lá vem ele. Não sei o que fazer para evitá-lo. Ele
habita este lugar e a pouco atestou sua residência fixa. Importuno é o que é.
Mora, mas não respeita a rotina dos demais moradores – geralmente vai dormir
tarde. Contudo, quando cai no sono, ronca alto. O resultado disso? Previsível:
no outro dia, todos com olheiras. Como foi aparecer-me um inquilino desses. No
início, na apresentação de si, parecia educado, menos hostil. Seu sorriso não
representava de todo mal – agora lembro. Não, não, não era confiável coisa
nenhuma! Tinha uma simpatia perversa no sorriso, tal qual como um demônio sádico
seria se fosse posto no exato centro onde pudesse transitar livremente entre o
céu e o inferno. Sim, o ponto fez-se aqui nesta casa: o inferno do faceiro
diabinho que passou a assombrar este antigo paraíso. Enquanto isso os outros
espíritos seguem a ranger os dentes.
.
sexta-feira, 10 de agosto de 2012
terça-feira, 7 de agosto de 2012
UM LUGAR CHAMADO FACEBOOK
Através
de setas e dedilhar de teclados, vamos fazendo do mundo um lugar onde o
trânsito de universos acaba por encontrar e refazer-se em um ambiente novo,
único e artificial. O animado local de todos e de ninguém, acaba por garantir
espaços e tempos privilegiados em nosso dia-a-dia. E isso não há como negar. Assim,
a vida se tornou uma festa dentro de casa, de quartos, de monitores. Circulamos
à toa, parados, mas por lá. Perdemo-nos e achamo-nos um pouco mais e um pouco menos. Compartilhamos.
Cutucamos. Desabafamos. Enfim, desafinamos. No início achamos que o mundo se
importa conosco. Durante, acabamos entendendo que nem nós mesmos pensamos isso
do outro do outro que pinta um outro que está do outro lado escondendo um outro
outro que no final das contas pode ser ainda outro.
Há
pouco tempo nem imaginávamos que um dia estaríamos tão próximos. Cruzávamos na
rua. Nem um cumprimento. Nem um mísero bom dia. Nada. Hoje entramos diretamente
no âmago das casas só para dizer: “Olá! Como vai... Estou triste... Estou
alegre... O sol está lindo... Está chovendo...”. É! São tempos sem campainha, porém, vamos
lembrando que as janelas estão abertas e tem sempre um cabeção espiando.
Nesse
lugar, inclusive, novas mentalidades vêm se formando. Novos grupos. Novas
verdades. Um mundo onde a expressão não está mais na primitiva equação entre
lábios e olhos, mas entre links, emoticons
e frases geralmente curtas. Poucos leem textos maiores por lá. Este último
elemento, infelizmente, não é mera coincidência com as particularidades reais que já conhecemos. Contudo (como um desses navegadores e,
volta e meia, protagonista também dos mesmos destemperos que cito), sei que se
a convivência já é difícil. Penso também que é um verdadeiro milagre que
pessoas (que são essencialmente únicas) consigam conviver por tanto tempo em um
mesmo local, uma vez que tomamos nossa casa como um castelo e, como reis, queremos
sempre a última palavra. O problema é que
há uma só coroa e muitas cabeças “reais”. Explico: Quando apareço pela tela do
outro, sou como um súdito, ao mesmo tempo em que sou o imperador, pois a fala
saiu de meus domínios. Complicado.
Acho
que no futuro – quem sabe – o garimpo cultural humano, feito geralmente por
antropólogos, acontecerá de dentro do facebook. Um ambiente perfeito para se
estudar a complexidade da convivência e de uma vida social que não tem nada de
exatidão. Ainda bem!
E
como já escreveu uma vez Fernando Pessoa: “Navegar é preciso; viver não é
preciso.”.
segunda-feira, 6 de agosto de 2012
PAI, LER DEMAIS PREJUDICA A VISÃO?
Minha filha perguntou-me se ler demais prejudicava a visão. Respondi
que sim, porque nunca mais o mundo é visto da mesma forma, ele deforma-se, estica,
abre-se e depois clareia. Tudo isso por conta de me ver sempre lendo com
o auxílio de óculos incômodos e feios. Não disse, mas sei que teve medo de no
futuro ter a prisão decretada por um par dessas lunetas. Pensando nisso, ao ver
a disposição com a qual se debruçava sobre determinada obra, logo pensei que deveria
pôr mais luz sobre as folhas para que não sofresse com os efeitos do tempo que eu
sofro, já que também, felizmente, anda gastando-o com livros. Contudo,
respeitando as limitações do corpo, achei por bem tomar a atitude de reajustar literalmente
o abajur. Claro, para não perder o conforto, o foco e a razão que a movia a
folhear tão deliciosas páginas. Coisas de pai!
Ultimamente ando observando uma maior vontade de
ler por parte de minha menina. Compreendi que antes, perguntando-me sobre o que
era melhor ou não, eu acabava inevitavelmente vendendo um gosto particular e
que, apesar de termos o mesmo sangue, naturalmente, como todos no mundo o são,
somos diferentes. Digo mais, temos idades e anseios distintos. Acordei para
isso após perceber que dormia para seus sonhos e perspectivas adolescentes.
Como o abajur, clareei também. Subestimei o poder das palavras ditas e
concebidas para seu gênero de gostos e inquietações, já que sem um início não
pode haver meio e muito menos fim. Comecei pelo fim, eis o meu erro.
Confesso que não gosto de livros muito
populares, penso que eles extrapolam e reduzem elementos que deveriam abarcar o
todo e, ao mesmo tempo, atingir a todos individualmente. Chamam isso de ontologia.
Penso que tudo o que é feito para agradar o maior número de pessoas, não pode
ser bom, uma vez que, como dito acima, ninguém é igual, não pensam igual e,
sendo assim, não poderia existir fórmula que pusesse na mesma dimensão tantas
diferenças. Então me pego aqui, vislumbrando a exclusão que fiz ao negar por
tanto tempo o que as palavras poderiam dar no passeio imagético em que apenas
uma única visão faminta poderia perceber e escolher por si só: a do simples
prazer despreocupado de uma leitura.
Dito isso, exponho a obra (“Crepúsculo”, de Stephenie
Meyer), ressaltando, inclusive – indiferentes às minhas vontades, verdades e
gostos –, meu prazer em ter visto mais de cem páginas sendo devoradas ao meu
lado em apenas um final de semana por minha garotinha de treze anos.
Do início vai-se ao meio e ao meio vai-se ao
fim. Assim, um dia ela entenderá os caminhos que lhe aguardam pelo mundo e
pelas prateleiras da “bibliotequinha” cheia de palavras e inquietações do
papai.
sexta-feira, 3 de agosto de 2012
NA LITERATURA TEM QUE HAVER MOSCAS
Sabem
aquelas vozearias que vão timidamente latejando em nossos ouvidos? Estas são as
que produzem os melhores e os piores sons já sentidos, pois, ao invés de nos confortar
com uma melodia agradável e de poucas notas, acabam por nos tirar quase toda a
tranquilidade através de zumbidos quase inaudíveis, mas que ficam na volta só
para incomodar, enlouquecer e estorvar. Espantá-las? Isso é inútil. Elas são
ligeiras demais e de tão rápidas, mesmo que se resolva fechar o livro
rapidamente para esmagá-las, voam para fora e mais tarde retornam todas
refesteladas para continuar a nos provocar com seus zum, zum, zuns. Delas, não há como escapar, uma vez que os olhos
já foram conduzidos a acompanhar todo movimento dessas moscas malvadas ao
sentarem-se sobre as palavras e fecundá-las, acabando, enfim, por proliferar o
que deveria permanecer puro e parado assim que fechássemos a obra. Não há o que
fazer. Basta apenas assistir ao parto dessas palavras grávidas
de mosquinhas incômodas que vão aos poucos saindo, enegrecendo, criando asinhas
e voando para longe, bem longe... Até que, quando nos pensamos livres, elas
retornam ainda mais gulosas por fecundar as outras inocentes que se encontravam
relaxadas e quietinhas, apenas querendo manter o sossego e a virgindade.
terça-feira, 24 de julho de 2012
CULTIVO HUMANO NOS SÍTIOS DE RELACIONAMENTOS
Os dias de hoje nos trazem
novidade, rapidez de informação e praticidade na arte da convivência. Não seria
maluco em afirmar ou negar piamente essa lógica, mas, na fuga da alienação, não
há como estar fora disso sem cometer o pecado da não existência (pelo menos no âmbito
virtual, já que praticamente todos estão por lá e, creio, só é possível existir
pelas suas vozes, ou no caso, pelos teclados). Conheço amigos que até tentaram
fugir disso. Outros, mais resistente, ainda insistem em não adentrar por
aquelas paragens “inférteis”, em suas opiniões. Contudo, temendo a falta de
trânsito humano por não pegar carona no veículo da máquina, o tempo certamente
os fará ceder quando não encontrarem mais ninguém nas ruas. Não estou
defendendo nenhum “site” de relacionamento ou a extinção de praças e locais de
encontros reais, apenas tendo ser razoável ao tratar dos espaços virtuais, uma
vez que ando passeando e existindo por alí também e cada vez mais se apagando
para os encontros que exigem um pouco mais de interação física do tipo olho no
olho.
Não sei se há coerência
neste meu trato, o que sei é que não podemos tapar os ouvidos para o “boom” que
isso se tornou, visto – no que temos observado – a força incrível quando o
assunto inclina-se a decisões de algo que, por insistências de links, acabam
por vezes no território arriscado do comum acordo. Veja, por exemplo, a
quantidade de candidatos que andam nos enviando convites nestes tempos tortos e
eleitoreiros; acompanhem as inquietações cada vez mais afuniladas para o
pessoal, dá até para saber o ânimo em que se encontra a pessoa do outro lado,
até quando ela vai fazer xixi, sabemos; e veja também o quanto os olhares se
cruzam ao manifestar pensamentos que minutos depois já são frutos de
arrependimentos. Meu medo é que as pessoas caiam nas armadilhas das repetições
emocionais de outrora, digo isso de maneira a prever uma espécie de conspiração,
pois, nos momentos em que estamos vulneráveis (e vemos muito isso) um simples digitar
consolador pode criar uma atmosfera perigosa de interesses que ultrapassam o
outro e acaba por proliferar-se. Perigosa essa interação, o que é natural quando
muitas ideias se atropelam em um mesmo lugar. Cuidado, os políticos já sabem
disso. E, hoje, o invés de beijar criancinhas pelas ruas, nos mandam links bipolares,
perpassando pelos adoráveis onde tudo são gentilezas e colorido, até críticas
contundentes à oposição (esta disposta em Maquiavel, O Príncipe. Não é uma
ideia nova!).
Enfim, acho que devo parar
por aqui para não me comprometer mais. Isso também é perigoso!
Texto publicado também no Jornal Zero Hora: http://wp.clicrbs.com.br/opiniaozh/2012/08/07/artigo-online-cultivo-humano-nos-sitios-de-relacionamentos/?topo=13,1,1,,,13
Texto publicado também no Jornal Zero Hora: http://wp.clicrbs.com.br/opiniaozh/2012/08/07/artigo-online-cultivo-humano-nos-sitios-de-relacionamentos/?topo=13,1,1,,,13
domingo, 22 de julho de 2012
PROFESSORES LEITORES E ALGUNS DISSABORES
Quando
comecei a frequentar a escola, não sabia ao certo o que realmente ela
representava. Falo em um diálogo comigo mesmo, uma releitura de minhas memórias
que admito estarem fragmentadas em pequenos flashes. Porém, hoje, – penso –
tendo condições mais claras e próximas, venho ponderar o início dessa construção.
O
fato é que tudo começou pelo gosto tardio pelas palavras, não por imposições ou
obrigações, mas com exemplos de leitores de verdade, leitoras reais que foram
algumas de minhas inspirações. Certamente, sendo a Literatura uma espécie de
arte, nenhum argumento justificaria – acredito – a possibilidade de ela nos
orientar para caminhos comuns e conhecidos como bons ou maus. Tenho para mim
que na verdade ela nos desorienta, nos colocando, inclusive, em territórios de
desconfortos, inquietudes e desestabilidades. Essa Senhora de voz silenciosa, nos
instiga também ao desconserto dos pensamentos prontos e nos instiga a reinventarmos
aqueles outros que já estavam em nós. Tal como faço aqui ao revisitar o garoto
que fui e que agora estranho ao recordar.
Confesso,
em meio às limalhas que vão caindo aqui neste texto, que não saberia dizer o
quanto sinto ao perceber a hipocrisia do “pulo”, já que como disse, tive
inspirações. Explico: Só posso pedir que alguém salte se eu tiver saltado antes.
Deste modo, de pulo em pulo, vamos resumindo pensamentos que vão ficando sempre
no escanteio e na superfície das hipóteses. Pois todos já sabem que ler é “bom”
e que enriquece blá, blá, blá... Mas não vejo mais aqueles exemplos de carnes,
ossos e espíritos. Àqueles em que falei lá em cima e que tive o prazer de
revisitar sobre outras carnes durante a graduação, desde colegas até
professores.
Sei
também que não sirvo de exemplo para nada. Na verdade ninguém é integralmente
exemplar. Mas tenho os meus espaços no tempo aonde vou costurando e dando forma
aos tecidos que vão sendo puxados das linhas coloridas de alguns leitores vivos
e percebidos ao longo de meus tempos.
Assim,
a autocrítica me vem para tapar o rosto de vergonha com o mesmo tecido que
acabei de criar por aqui, uma vez que, desde que percebi os olhares da leitura,
vi também as falhas que estavam impressas em meus pontos de vistas. Contudo, percebi
que era, também, humano e que como tal, é natural que tenha vícios ou falhas,
na qual aponto todas, menos a de pregar em “pulos” uma leitura exata do que
nunca conseguirei fazer: a de mim mesmo.
Obs: Texto publicado também no Jornal Diário Popular de Pelotas (24/07/2012): http://www.diariopopular.com.br/site/content/noticias/detalhe.php?id=8¬icia=55080
Obs: Texto publicado também no Jornal Diário Popular de Pelotas (24/07/2012): http://www.diariopopular.com.br/site/content/noticias/detalhe.php?id=8¬icia=55080
segunda-feira, 16 de julho de 2012
A NARRATIVA NÃO ACABA, RENOVA-SE NAS VOZES.
Motivados por algumas aulas de
Narrativas Midiáticas Contemporâneas, surgiram algumas questões que exponho
aqui como forma de compartilhar as inquietações. Assim, como aluno, leitor e
ouvinte, ocorreram-me verdades que não sei bem se são de fato respondíveis ou ao
menos relevantes, pois como disse, ainda estou inquieto. O que sei é que nelas ando
encontrando caminhos novos para conversar com outros veículos de informação,
além das obras de valor literário construídas por jornalistas e nas quais venho
tomando conhecimento nestes últimos meses.
Como nosso foco tem se destinado a um
estudo sobre o Jornalismo em diálogo com a Literatura, tivemos, meus colegas e
eu, discussões bastante ricas, sobretudo durante as aulas, no que diz respeito
a essa afinação de sentidos. Penso que como meio de informação, ou manifestações
de ideias, tais áreas estão sim, – porque não? – em constantes movimentos e
reencontros, uma vez que as duas tendem a tecer um pacto, digamos assim, com seus
possíveis leitores. Assim, em busca de um setor que me fornecesse subsídios
para fazer conexões, ou analogias, com as duas (Jornalismo e Literatura),
resolvi abranger os caminhos e alargar os espaços com reflexões bastante
pessoais, ainda sendo amadurecidas no momento, mas latentes durante as leituras
que ainda fazemos para a disciplina e presentes nas conversações que ainda
temos em aula. O motivo seria o de tentar entender o trânsito e o ponto em
comum que acaba pertencendo aos dois lados: o de narrar. Uma vez que ambas tem
em seu cerne a mesma tentativa de informar algo se utilizando do mesmo veículo,
a linguagem.
Entrando, então, para uma possibilidade
que extrapola para a filosofia, lembremos a conhecida máxima de Heráclito de
Éfeso: “Não te banharás duas vezes no mesmo rio”. Valendo-se disso, pensemos agora
em um jornalista que tem como missão repassar um acontecimento. Certamente ele
o fará da forma mais aproximada que encontrar. Apesar do esforço, notemos que o
fato acaba se distanciando, – mesmo que o profissional não tencione isso –
pois, enquanto recontado, ele (o fato), inevitavelmente, passará a acontecer
novamente e encontrará caminhos novos, até mesmo sutis, sob a versão, agora, de
seu narrador. Na mesma linha seguirão os leitores (imaginemos aqui o jornal como
exemplo), cada qual receberá a notícia obedecendo a valores de ordens pessoais,
frutos de suas construções locais/sociais e até mesmo individuais. Ocorre aí
mais um enxugamento da primeira impressão da notícia. Mas o que sobra dela,
afinal?
Este espaço de “entre-lugar” pode nos
fazer entender o porquê de alguns jornalistas acabarem caindo nas graças da
literatura e vice-versa. O mote inicial talvez esteja na tentativa de buscar
maior universalidade ao repassar as imagens, agora, autenticamente
reconhecíveis na predisposição de uma nova possibilidade de reinvenção. Visto encontrar-se
com a verossimilhança ao invés de tentar resgatar fatos puros que se contagiam
a cada novo reconte. Mas o que vem a ser um fato puro?
Como já vimos, os pontos podem variar,
logicamente. Nisso, na posição de sempre estar tentando amarrar as duas partes,
do fato e do (re) leitor do fato, o narrador acaba por criar mecanismos que
acabam por afastar ou aproximar o receptor do lugar descrito, mas o alcance
acaba sempre por fugir, uma vez que ele já aconteceu sob os vários olhares
únicos que o flagraram.
Desta forma, vamos recriando e
organizando nossas ideias, estas agarradas por esse fio tênue que faz com que
os leitores acabem encontrando ou, se a linha partir, perdendo-se em suas próprias
versões. Tendo, inclusive, que reencontrar-se no labirinto das vozes que ouve,
lê ou recria.
Assim, concluímos que o ato da narrativa
nunca acaba. Ela apenas se renova sob todas as vozes e cores que encontra. E é
nessa refacção de elementos que vamos dando partida ao entendimento das informações
literárias em conjunto com as narrativas midiáticas, tendo como obrigação
complexificar um pouco sim, uma vez que não há como inferir se não houver o
combustível das inquietações. Contudo, abastecido pelas aulas, acabei, acho, fazendo
algumas ponderações longínquas, no que vou relembrando se tratar de uma reflexão
pessoal, portanto, como qualquer opinião não profissional (não sou jornalista),
é totalmente discutível.
Obs: Texto publicado também no Jornal do Comércio de Porto Alegre (24/07/2012): http://jcrs.uol.com.br/site/noticia.php?codn=99191
Obs: Texto publicado também no Jornal do Comércio de Porto Alegre (24/07/2012): http://jcrs.uol.com.br/site/noticia.php?codn=99191
terça-feira, 10 de julho de 2012
A MENINA DOENTE QUE ME TRAVOU O POEMA
Outro
dia, tal como sempre fazemos nas noites de sextas-feiras, seguimos para casa de
meus pais. Antes de sair, minha filha mais velha perguntou-me se podia levar um
livro para distrair-se enquanto estivesse por lá. Claro, leve mesmo! – respondi
em meio à ligeireza de ter que preparar a menor para o encontro, já que estava
um tanto doentinha. Esperaríamos minha
esposa por lá. Seu horário a obrigava a chegar mais tarde do trabalho e, como
sempre, seguiria direto.
Uma
vez na casa, minha mãe – antes que eu falasse qualquer coisa – olhou para os
olhinhos tristonhos da pequena e logo constatou que algo não estava certo.
Pegou-a nos braços, pôs-lhe uns panos sobre a testa e a embalou. Sua atenção
estava voltada inteiramente para ela e de sua conversa, quase um sussurro, só
se entendia: “Gatinha, se esquenta aqui no colo da Vó. Essa febre malvada...”.
Assim, deitadinha, ela foi melhorando e, antes da chegada dos demais (minha
irmã também viria), já estava ensaiando um sorriso. É, estava melhor! Motivado
por isso, o espírito de meu pai melhorou, estava, naturalmente, também
preocupado e vendo que ela já estava nas mãos certas, principiou nosso, então, chimarrão.
A
conversa evoluía, uma vez que a semana pareceu bastante longa e todos tinham
algo a dizer dela. De fato o tempo passa rápido quando se está entre a família!
Pois, acredito, que enquanto o mundo nos tira em verdades, nossos pais repõe
com sinceridade para, assim, sairmos todos melhores ou, no mínimo, pensativos
sobre nossas eleições. Em meio a tudo isso, minha outra filha, mostrando-me
discretamente o então livro, apontou-me para o poeta. “Conhece ele, pai?” Nossa! Naquele momento, ao folha-lo,
encontrei-o por inteiro e relembrei pensativo de algumas aulas de Literatura na
faculdade. O livro era uma dessas antologias editadas pelo MEC. Seu autor,
Manuel Bandeira. Li baixinho alguns deles e quando cheguei ao poema “O menino
doente”, parei. Então, pedindo a palavra, solicitei se eu podia dizê-lo e se
estavam dispostos a isso. Sim, todos ouviram. Contudo, não de todo, porque ele
travou-me à língua ao ver minha mãe olhando-me atenta e segurando “a minha
menina doente”. Disfarcei. Tomei fôlego. E fui em direção ao banheiro.
Confesso
que procurei mais tarde o poema, mas nunca consegui recitá-lo em voz alta. Ele
ainda me trava. Ele ainda, de certa forma, me leva de volta e me agride com
suas imagens. Sempre me emociono e me calo antes mesmo de terminá-lo.
Eis
o poema:
O MENINO DOENTE
O
menino dorme.
Para
que o menino
Durma
sossegado,
Sentado
ao seu lado
A
mãezinha canta:
–
“Dodói, vai-te embora!
Deixa
o meu filhinho,
Dorme...
dorme... meu...”
Morta
de fadiga,
Ela
adormeceu.
Então,
no ombro dela,
Um
vulto de santa,
Na
mesma cantiga,
Na
mesma voz dela,
Se
debruça e canta:
–
“Dorme, meu amor.
Dorme,
meu benzinho...”
E
o menino dorme.
(Manuel
Bandeira)
segunda-feira, 2 de julho de 2012
Exercícios de Ser Criança: um passeio pela fantasia em Manoel de Barros
Resumo: Neste artigo, abordamos a incorporação da infância nos estudos sociológicos analisando o texto A Menina Avoada, de Manoel de Barros. Apresentamos a criança como um ser humano em formação e potencialmente capaz de criar e de modificar culturas, considerando seus processos de apropriação, reinvenção e reprodução realizados na interação com os outros e em seu desenvolvimento. Estudamos os quatro eixos estruturadores das culturas da infância: ludicidade, fantasia do real, interatividade e reiteração. Entendemos, também, que a palavra escrita e as ilustrações são fundamentais à compreensão plena da obra, conjunto gerador de significados que nos impõe a necessidade de repensarmos nossas concepções sobre criança, infância e cultura.
Palavras-chaves: criança; sociologia da infância; literatura e infância; leitura da literatura na infância.
Veja o artigo completo no Link:
terça-feira, 27 de março de 2012
quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012
CURUPIRA**
Em busca do passo passado
Passei por caminhos já dados
No acerto de passos batidos.
Espaços levados a outros
Passos perdidos na estrada,
Perdidos nos pés invertidos
‘Do ente’ pés tortos da mata.
** Ouçam as aliterações (os sons provocados quando recitados, aqui, os 'S's) e perceberão os passos arrastados de meu Curupira.
Não o siga, pois ele tem pés ao contrário e te levará à demência... Abraços!
quarta-feira, 25 de janeiro de 2012
AO SOM DOS QUATRO VENTOS
Os ventos viajam velozes
Com asas que zunem
Em verdades que vibram vitimadas
Pelas vontades contidas
De Noto, Euro, Zéfiro e Boreas.
Eles que sabem surgir e sumir
Saindo quando o seguinte soergue-se
Sempre ao controle do simples suspirar,
Em comando, do mestre Éolo:
Deus de Sábio semblante
Que quando assovia, sibila...
Varre e vira qualquer desses ventos
À sua bel vontade...
domingo, 13 de novembro de 2011
DON QUIXOTE & SANCHO PANÇA, UMA RELAÇÃO ESQUIZOFRÊNICA**
Suponhamos que nossas razões e emoções pudessem existir em dois corpos distintos. Chamaremos cada uma dessas partes de ‘Sancho Pança’ para a primeira e ‘Don Quixote’ para a segunda. Visto ser Pança um personagem gordo e que está totalmente calcado na relação com os elementos concretos do mundo (adora os prazeres da carne) e Quixote, ao contrário, exibe um físico magro e relações pouco preocupadas com a realidade física, podemos entender perfeitamente, neste caso, que o metafísico e o real estão literalmente divididos aqui em dois corpos diferentes. Miguel de Cervantes, o criador das criaturas, separou-os propositalmente de forma analítica – pelo menos em nossa leitura – para que pudéssemos perceber de maneira mais clara duas características da condição humana que, naturalmente, ocupariam um mesmo organismo/corpo. A intenção – cremos – não é de provocar ou insuflar uma situação maniqueísta (filosofia Persa que separa o bem do mal), mas provar que ambas são dependentes.
Acompanhemos a alegoria:
Imaginemos um balão cheio de gás e que toma altitude de acordo à vontade de outro SER que segura a corda que está amarrada ao bocal desse balão. Sancho, já que é pesado e tem relação segura e firme com a terra, aqui representará esse SER; e Quixote, magro e tido como sonhador, representará o balão. Todos sabem que tomando certa altura o objeto pode estourar e desaparecer, vide sua fragilidade. Daí então a importância de quem segura a tal corda, pois é ele quem regula o limite de subida dessa “bexiga”. A razão não sobrevive sozinha e a emoção, igualmente subordinada, também não. Mas seu fiel escudeiro, Sancho, em um momento de distração, afrouxa nosso suposto fio – o da medida/metrum – fazendo com que o balão, voando em uma altitude difícil de recuperar, escape às suas mãos, causando assim o rompimento e a desvinculação da razão com a emoção, o que explica a morte de nosso “Cavaleiro da triste Figura” ao final da novela. Enfim, não é possível que exista um sujeito essencial e exclusivamente racional ou emocional, somos as duas coisas, dependemos delas e nos equilibramos com elas. Cervantes há quase quinhentos anos (1605) já sabia disso, então nada aqui é novidade.
As versões “tele-novelísticas”, contudo, ainda insistem (em pleno século XXI) em querer nos convencer de que não é possível a incorporação das duas partes em uma. Fazem-nos crer que o protagonista e o antagonista ou a razão e emoção não podem coexistir em um mesmo personagem. Com isso acabamos entendendo que a parte que concerne ao “bem” deve ser tão doce que chega a atrair formigas e nos causar náuseas; e o “mal” tão negativo que representa a ruína total e o dissabor de um propósito inverossímil de humanidade.
Machado de Assis, em seu Dom Casmurro , nos prova essa tendenciosa prática em aceitarmos verdades impostas e unilaterais. A maioria dos leitores ao acompanhar os relatos de Casmurro, tende a cometer sempre o mesmo erro: condenar Capitolina como adúltera. Mas o que temos que levar seriamente em conta é que estamos sendo conduzidos pela voz do velho Bentinho, Dom Casmurro, e que não há imparcialidade em sua fala, portanto não podemos esquecer de controlar as memórias emocionais do personagem com os fatos racionais (uma vez que não conhecemos a versão de Capitu). Pensando nisso, não olhemos para os olhos de Capitolina com a mesma objetividade que Otelo (na desmedida entre razão e emoção), erroneamente, olhou para o lenço de Desdêmona. Permitamos nos achar e não perder-nos sob a ressaca provocada pela sutileza de um primeiro olhar. Encher a barriga com eles, do ponto de vista exclusivo de Bentinho (emocional), seria provocar uma tragédia semelhante ao que, injustamente, selou o destino da mulher do poderoso Mouro, Otelo. Peço que não cometamos o mesmo. Julgar uma possível traição objetivamente é não saber apreciar o senso dos sabores das bruxarias provocadas pela dúvida que fez amarrarem-se as duas pontas do tempo e da consciência de Bento.
Na mesma linha de raciocínio, Platão, em seu “Hípias Menor”, nos traz alguns questionamentos sobre o tema da mentira, em pensamentos conduzidos pela voz de Sócrates em discussão travada com um sofista chamado Hípias. Afinal quem é o mais mentiroso entre os heróis de Homero, Aquiles ou Odisseu? Claro, em sua extrema sabedoria, Sócrates prova ao pouco modesto Hípias que nem um nem outro devem ser escolhidos, uma vez que cada um deles faltou à verdade ao seu próprio tempo e necessidade. O que se deve levar em conta é que todos possuem, aglutinadas, as essências desses dois gregos homéricos: a força temperamental de Aquiles, representando a emoção; e a estratégia racional de Odisseu. Ambos, homens ou semideuses, propensos à corrupção.
Se quisermos novelas, leiamos as quixotescas e aprendamos a lidar com situações que explorem – em formatos mais inteligentes – toda a nossa complexa psique. Fujamos à esquizofrenia patológica de classificações definitivas, estereotipadas e ditatoriais. Abramos mais livros e, se acaso optarmos em abrirmos bíblias, tentemos não julgar os ateus como se fossem reencarnações de demônios mefistofélicos, pois ninguém é integralmente santo. Ninguém!
** Esse texto foi publicado no jornal Gazeta do Sul no dia 23 de maio de 2011 ( http://cronutopia.blogspot.com/2011/05/publicado-na-gazeta-do-sul-do-dia-23-de.html), mas reponho-o novamente como forma de homenagem a uma futura acadêmica das letras que levará consigo seu próprio volume de Quixote. Um abraço a minha querida Cigana Carmen (epíteto que adotamos nas aulas de Literatura para burlar seu nome de nascença, Sandra Borges, e autenticar o de renascença literária, Carmen) .
Espero que tenha apreciado essa leitura pretensiosa, querida!!! Abraços do Professor!!!
sexta-feira, 11 de novembro de 2011
TRABALHO DE LITERATURA SOBRE O QUINHENTISMO....
Trabalho de Literatura: Quinhentismo.
Aqui minhas alunas do primeiro ano do ensino médio da turma 1º A da Escola Frederico Kops de Sinimbu, interpretam belamente a concepção e o envio da Carta de Pero Vaz de Caminha ao El-Rei D. Manuel. Percebemos também alguns aspectos da literatura de Catequese com Pe. José de Anchieta doutrinando os povos autóctones entre outras descrições que ganham cor ao som da música de Debussy...
Parabéns às pupilas: Amanda Müler, Patrícia dos Santos, Marília Stölben, Larissa Pranke, Simone Vogt, Bianca Stulp, Janaína Sturmm, Jéssica Wegner, Jociana Cruz e Vitória Panke.
Um excelente trabalho queridas!
O professor está orgulhoso!!!
quarta-feira, 2 de novembro de 2011
A COMÉDIA DO DINHEIRO**
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Os maiores devaneios do mundo giram sempre em torno de riquezas incalculáveis. Algo como um gênio que aparece misteriosamente de dentro de uma lâmpada para realizar, em média, três desejos dos tipos, respectivamente: financeiros; e, para variar, dois outros que sempre são um mistério, pois variam de Aladim para Aladim. O fato é que outro dia tive uma surpresa que causaria furor e inveja a qualquer banqueiro suiço, porque ao invés de uma lâmpada maravilhosa tive o próprio deus da fortuna descansando em minha casa.
Explico: A deidade, modéstia a parte, escolheu minha filha para conduzi-lo, pois sendo já idoso e cego, optou por um ombro que fosse ideal em altura, conforme exigiam suas limitações, e inabalável a seus poderes, uma criança. A menina atraiu Pluto para fora de seu mais antigo abrigo, a biblioteca (essa nas dependências da Escola Estadual Paraguaçu e sob a regência da professora Tânia Lisboa, que optamos citar para inspirar outras), reconhecendo na adaptação do comediógrafo grego, Aristófanes (455 a. C – 375 a. C, aproximadamente), em uma versão para jovens, uma obra que ainda continua despertando curiosidade e inquietação aos nossos adultos e pequeninos leitores. O fato é que essa Comédia acabou trazendo mais fortuna para nossa casa do que poderia produzir o próprio rei Midas com seu poder de transformar em ouro tudo que tocava. Minha menina, hoje, é um pouco mais rica por reconhecer, em seu tempo e jeitinho, uma obra que explora essa metáfora tão atual e engraçada: o infortúnio em perseguir o dinheiro à custa de nossa liberdade – e isso é de fato uma comédia! –, pois, como seguidores e “visionários” auto-proclamados, tornamo-nos escravos voluntários de um velho cego de 2455 anos de idade que anda a esmo pelo mundo.
Pobre Pluto, seu simples desejo foi o de distribuir o dom da fortuna aos homens dos quatro cantos do mundo; contudo, obviamente, isso não poderia acabar muito bem – e deveras não acabou. Irritado com a desarmonia, Zeus, de um só golpe, cegou-o com um de seus raios e fez com que nós, os ambiciosos mortais, agora tivéssemos que correr a perseguir a riqueza por toda a parte e não mais o contrário. Quem é o cego afinal? E como uma menininha com apenas onze anos – em pleno século XXI – pôde atraí-lo?
Enfim, hoje tenho uma filha rica, logo vai ter um castelo, vide ter emprestado seus olhos a Pluto e apr(e)endido um pouco mais sobre a vida com ele!!!
Enfim, hoje tenho uma filha rica, logo vai ter um castelo, vide ter emprestado seus olhos a Pluto e apr(e)endido um pouco mais sobre a vida com ele!!!

** Texto publicado em 2 de abril de 2011, mas reconduzido até aqui por conta de uma boa lembrança!!! Parabéns filhota!
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