Como muito bem disse Affonso
Romano de Sant’Anna: “[...] literatura é também isso, um contar, recontar,
tecer e destecer tramas e urdiduras num interminável bordado textual.”.
Explico: Por ser meu
aniversário, meus pais passaram aqui em casa com a seguinte informação:
"Pega esse dinheiro, compra um livro pra ti." Mesmo eu recusando,
deixaram uma nota de cinquenta sobre a mesa e, ao meu entorno, o calor de dois
abraços que diziam muito sobre eles dois. Certo, fui fiel ao pedido e comprei
as obras “Os três mosqueteiros”, de Alexandre Dumas; e “A morte e a morte de
Quincas Berro Dágua”, de Jorge Amado.
Seguindo o que disse
Sant’Anna, tomo como embrião aqui neste texto, o último: as muitas mortes que
teve Joaquim Soares da Cunha, o nosso Quincas.
A novela trata do
velório de um homem que teve duas mortes, uma social e outra literal. Na
primeira, após os cinquenta anos de idade, ele decide deixar a família, abre
mão até de um bom e respeitável emprego para ganhar as ruas, ser livre. Deixa
de ser o Sr. Joaquim, respeitável funcionário da Mesa de Rendas Estaduais, para
iniciar sua carreira de vadiagem em um bar de pouca fama. Local onde, ao tomar
seu primeiro gole de cachaça fora de casa, lança um berro que fez com que todos
caíssem na gargalhada. Daí o nome, Quincas Berro Dágua.
Dizem que a história
surgiu do “disque me disque” das ruas baianas, tal como gostava o Amado, porém,
segundo Romano de Sant’Anna, a verdadeira situação aconteceu em território
cearense. O que explica a citação feita no início deste texto.
Contudo, – fora a
alegria e as risadas arrancadas de mim por essa novela – quero ressaltar algo
que anda nas “estrelinhas” do texto (ou entrelinhas, se melhor compreende o
leitor, como queria!). Apesar de me divertir, notei que há algo mais na vida
desse Quincas. Não se trata apenas de sua morte, mas das pequenas mortes que
todos temos em vida. Todos somos meio Berros Dágua. Quando resolvemos redimensionar
as velas de nossos barcos e seguir para outros caminhos, morremos para o sul,
por exemplo, para renascermos no norte. Temos esse direito. Portanto, não pude
ler a obra como outra qualquer, fiquei refletindo. Ela é a versão mais bem-humorada
e moderna de Heráclito de Éfeso: “Não te banharás duas vezes no mesmo rio”.
Quer morrer hoje? Então
“Carpe diem”, comece lendo “A morte e a morte de Quincas Berro Dágua”. Vadiar
também é preciso. Vadie pela literatura e renasça!
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