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quarta-feira, 20 de maio de 2015

AS MUITAS MORTES E VIDAS QUE PODE TER UM QUINCAS

Como muito bem disse Affonso Romano de Sant’Anna: “[...] literatura é também isso, um contar, recontar, tecer e destecer tramas e urdiduras num interminável bordado textual.”.   
Explico: Por ser meu aniversário, meus pais passaram aqui em casa com a seguinte informação: "Pega esse dinheiro, compra um livro pra ti." Mesmo eu recusando, deixaram uma nota de cinquenta sobre a mesa e, ao meu entorno, o calor de dois abraços que diziam muito sobre eles dois. Certo, fui fiel ao pedido e comprei as obras “Os três mosqueteiros”, de Alexandre Dumas; e “A morte e a morte de Quincas Berro Dágua”, de Jorge Amado.
Seguindo o que disse Sant’Anna, tomo como embrião aqui neste texto, o último: as muitas mortes que teve Joaquim Soares da Cunha, o nosso Quincas.
A novela trata do velório de um homem que teve duas mortes, uma social e outra literal. Na primeira, após os cinquenta anos de idade, ele decide deixar a família, abre mão até de um bom e respeitável emprego para ganhar as ruas, ser livre. Deixa de ser o Sr. Joaquim, respeitável funcionário da Mesa de Rendas Estaduais, para iniciar sua carreira de vadiagem em um bar de pouca fama. Local onde, ao tomar seu primeiro gole de cachaça fora de casa, lança um berro que fez com que todos caíssem na gargalhada. Daí o nome, Quincas Berro Dágua.
Dizem que a história surgiu do “disque me disque” das ruas baianas, tal como gostava o Amado, porém, segundo Romano de Sant’Anna, a verdadeira situação aconteceu em território cearense. O que explica a citação feita no início deste texto.
Contudo, – fora a alegria e as risadas arrancadas de mim por essa novela – quero ressaltar algo que anda nas “estrelinhas” do texto (ou entrelinhas, se melhor compreende o leitor, como queria!). Apesar de me divertir, notei que há algo mais na vida desse Quincas. Não se trata apenas de sua morte, mas das pequenas mortes que todos temos em vida. Todos somos meio Berros Dágua. Quando resolvemos redimensionar as velas de nossos barcos e seguir para outros caminhos, morremos para o sul, por exemplo, para renascermos no norte. Temos esse direito. Portanto, não pude ler a obra como outra qualquer, fiquei refletindo. Ela é a versão mais bem-humorada e moderna de Heráclito de Éfeso: “Não te banharás duas vezes no mesmo rio”.

Quer morrer hoje? Então “Carpe diem”, comece lendo “A morte e a morte de Quincas Berro Dágua”. Vadiar também é preciso. Vadie pela literatura e renasça! 

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