Nada me inquieta tanto
do que as mulheres retratadas pela História, Filosofia e Literatura – e é para
isso que servem mesmo, para nos inquietar. Não é de hoje que escrevo sobre
isso. Revi muitas delas em algumas leituras que fiz. Descobri – claro! – que
ninguém veio da costela de alguém, muito menos condenou toda a humanidade por
uma simples mordida. A metáfora – acredito – vem de algum símbolo que
represente o ato sexual. Corte uma maçã e verá duas genitálias femininas, uma
no meio de cada parte da fruta. Acho que é por aí que se pensou esse ‘pecado’
tão medonho.
Sim, ainda precisamos
aprender muito para alcançarmos o equilíbrio, pois não há mais motivos para
continuarmos levando ao pé da letra essas verdades. Perguntem a um biólogo, ele
dirá (arrisco-me) que nas primeiras semanas após a concepção, todos já fomos
mulheres. Depois sim é que, geneticamente, vamos sendo definidos. O que explica
nossos mamilos: brotos que, se não tivéssemos nascido homens, poderiam, não
necessariamente, alimentar outra vida. Pois então, nada no mundo é por acaso...
Inclusive, em outra linha de pensamento, a filósofa e matemática Simone de
Beauvoir deixou claro: “Ninguém nasce mulher, torna-se mulher” (citação
interpretada e condenada erroneamente por alguns ‘puritanos’ – no Enem 2015).
Torna-se, porque ao nascer, a sociedade já a vai transformando, moldando-a para
ser um tipo “aceitável” de fêmea. Por isso o “torna-se”. Entendido? Viu? Nem
foi tão difícil.
Seguindo, vejamos
alguns casos na Literatura:
Saibam que três nomes
já me tiraram o sono: Capitolina, Diadorim e Desdêmona. Leio-as sempre como capeta,
diabo e demônio. Nomes provindos da arquitetura de autores que não cometiam
excessos, respectivamente: Joaquim Maria Machado de Assis, João Guimarães Rosa
e William Shakespeare.
Capitolina, a nossa Capitu,
foi vítima de um caso contado, unilateralmente (ela não teve voz na obra), por
um doente da alma, um ciumento que não acreditava em sim mesmo, logo nem nela.
Quem não se lembra dos diálogos interiores de Bentinho (o Dom Casmurro)? Já em
“Grande sertão: veredas”, de Guimarães Rosa, a personagem, Diadorim, disfarçada
de homem, fez com que seu amigo, Riobaldo, questionasse a própria “macheza” ao
se pegar apaixonado por ela, ou por aquele que acreditava ser um homem. Nas
linhas de Shakespeare, por sua vez, Desdêmona serviu de isca à ira do invejoso
inimigo do mouro Otelo. Iago, sorrateiramente, o fez pensar que ela havia o
traído. Fez dela um demônio, causando a morte da moça pelas mãos do próprio
marido.
Nossa! E as mulheres
sempre no princípio da causa e da culpa. Seja mordendo uma maçã, sendo acusadas
no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) ou, simplesmente, sendo elas mesmas. Saibam,
senhores, que no final da Idade Média elas eram, inclusive, queimadas, não só
pelos caprichos da época, mas pelas figuras atraentes que representavam. Muitas
delas foram mortas por serem vistas como tentação do capeta, do diabo, do
demônio, como queiram. Explico: quando um clérigo ficava excitado ao ver uma mulher
(ele era humano), punha a culpa nela, nunca em si mesmo, já que simulava uma
figura santa, um Santo Iago. Santiago? Ah, um Bento Santigo! Casmurrice divina?
Chama purificadora? Sei lá. Só sei que a culpa era sempre delas.
Enfim, acho que as
coisas não mudaram muito. Sendo assim, achei positivo tornar tema de redação
(do Enem 2015) “a persistência da violência contra a mulher na sociedade
brasileira”. A situação precisa mesmo ser maturada e seriamente discutida. E não,
nada disso se trata de posição política, mas de reação intelectual de ambos os
lados, se houverem. Há muita luta envolvida. E pensar que a menina Malala,
ainda outro dia, levou um tiro na cara só porque ousou estudar. Impressionados?
Todos sabem, no Brasil, em menor grau, coisas desse tipo ainda continuam
acontecendo. Ora bolas! Em que século estamos mesmo?
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