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terça-feira, 3 de novembro de 2015

“NINGUÉM NASCE MULHER, TORNA-SE MULHER.”

Nada me inquieta tanto do que as mulheres retratadas pela História, Filosofia e Literatura – e é para isso que servem mesmo, para nos inquietar. Não é de hoje que escrevo sobre isso. Revi muitas delas em algumas leituras que fiz. Descobri – claro! – que ninguém veio da costela de alguém, muito menos condenou toda a humanidade por uma simples mordida. A metáfora – acredito – vem de algum símbolo que represente o ato sexual. Corte uma maçã e verá duas genitálias femininas, uma no meio de cada parte da fruta. Acho que é por aí que se pensou esse ‘pecado’ tão medonho. 
Sim, ainda precisamos aprender muito para alcançarmos o equilíbrio, pois não há mais motivos para continuarmos levando ao pé da letra essas verdades. Perguntem a um biólogo, ele dirá (arrisco-me) que nas primeiras semanas após a concepção, todos já fomos mulheres. Depois sim é que, geneticamente, vamos sendo definidos. O que explica nossos mamilos: brotos que, se não tivéssemos nascido homens, poderiam, não necessariamente, alimentar outra vida. Pois então, nada no mundo é por acaso... Inclusive, em outra linha de pensamento, a filósofa e matemática Simone de Beauvoir deixou claro: “Ninguém nasce mulher, torna-se mulher” (citação interpretada e condenada erroneamente por alguns ‘puritanos’ – no Enem 2015). Torna-se, porque ao nascer, a sociedade já a vai transformando, moldando-a para ser um tipo “aceitável” de fêmea. Por isso o “torna-se”. Entendido? Viu? Nem foi tão difícil.
Seguindo, vejamos alguns casos na Literatura:
Saibam que três nomes já me tiraram o sono: Capitolina, Diadorim e Desdêmona. Leio-as sempre como capeta, diabo e demônio. Nomes provindos da arquitetura de autores que não cometiam excessos, respectivamente: Joaquim Maria Machado de Assis, João Guimarães Rosa e William Shakespeare.
Capitolina, a nossa Capitu, foi vítima de um caso contado, unilateralmente (ela não teve voz na obra), por um doente da alma, um ciumento que não acreditava em sim mesmo, logo nem nela. Quem não se lembra dos diálogos interiores de Bentinho (o Dom Casmurro)? Já em “Grande sertão: veredas”, de Guimarães Rosa, a personagem, Diadorim, disfarçada de homem, fez com que seu amigo, Riobaldo, questionasse a própria “macheza” ao se pegar apaixonado por ela, ou por aquele que acreditava ser um homem. Nas linhas de Shakespeare, por sua vez, Desdêmona serviu de isca à ira do invejoso inimigo do mouro Otelo. Iago, sorrateiramente, o fez pensar que ela havia o traído. Fez dela um demônio, causando a morte da moça pelas mãos do próprio marido.
Nossa! E as mulheres sempre no princípio da causa e da culpa. Seja mordendo uma maçã, sendo acusadas no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) ou, simplesmente, sendo elas mesmas. Saibam, senhores, que no final da Idade Média elas eram, inclusive, queimadas, não só pelos caprichos da época, mas pelas figuras atraentes que representavam. Muitas delas foram mortas por serem vistas como tentação do capeta, do diabo, do demônio, como queiram. Explico: quando um clérigo ficava excitado ao ver uma mulher (ele era humano), punha a culpa nela, nunca em si mesmo, já que simulava uma figura santa, um Santo Iago. Santiago? Ah, um Bento Santigo! Casmurrice divina? Chama purificadora? Sei lá. Só sei que a culpa era sempre delas.  
Enfim, acho que as coisas não mudaram muito. Sendo assim, achei positivo tornar tema de redação (do Enem 2015) “a persistência da violência contra a mulher na sociedade brasileira”. A situação precisa mesmo ser maturada e seriamente discutida. E não, nada disso se trata de posição política, mas de reação intelectual de ambos os lados, se houverem. Há muita luta envolvida. E pensar que a menina Malala, ainda outro dia, levou um tiro na cara só porque ousou estudar. Impressionados? Todos sabem, no Brasil, em menor grau, coisas desse tipo ainda continuam acontecendo. Ora bolas! Em que século estamos mesmo?  

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