Não é segredo, todos
sabem que gosto de bichanos. Encontro sempre um silêncio pouco mais afinado ao
lado de alguns deles – são mestres nesse tipo de afinação. Houve um tempo em
que até minhas leituras não se completavam sem ter um amigo desses por perto,
acostumei-me com seus ronrons. Sem eles acabo existindo menos e ‘desengordando’
vontades maluquinhas por acontecerem maiores. Exatamente por isso resolvi pôr o
nome de minha primeira ‘afinadora’, de Sofia (sabedoria, em grego). Preciso
explicar o motivo? Enfim, aprendi com ela a ser eterno, pois, ignorante à
brevidade da vida, andava pelo mundo como se pudesse viver para sempre, e podia
mesmo. Diferente de outros animais (os que chamamos tão orgulhosamente de
irracionais), nós é que gastamos boa parte dos dias pensando e nos preparando
para o fim: à morte.
Nesse caso, chutar a
bola sempre para frente nos coloca em uma posição delicada, se comparado aos
‘de-sete-vidas’. Acreditamos em platonismos, ‘depois’ e ‘aléns’. Acabamos, de
maneira inevitável, nos esquecendo dos ‘agoras’ e de que o hoje é que é o futuro
de ontem. Em outras palavras, estarmos cientes de que nossos corpos têm prazos
de validade vai nos tornando breves e incapazes de aproveitarmos integralmente
um belo carpe diem. É isso: saber que
vai morrer não é o mesmo que saber que precisa viver. Observe os felinos, os
cães, os pássaros...
Visto isso, preciso
contar sobre o dia em que, pela primeira vez, vi um gato implorar por sua
própria vida. Estávamos eu e minha filha, a Caroline. Do carro ela avistou um
montinho amarelo sobre um formigueiro. Andei pouco mais devagar e constatamos
ser um gatinho debatendo-se, ao mesmo tempo em que era devorado pelas formigas.
Na calçada, perto do filhote, um homem mais velho ria daquele desespero –
havíamos encontrado o culpado. Paramos e pegamos o bicho (não o velho, refiro-me
ao gato). Levamos para casa, demos banho e colocamos remédio em suas ‘carnes-vivas’.
Era fêmea, recém-nascida e estava bem fraca. Sendo assim, fomos alimentando-a
com a ajuda de mamadeiras e improvisos, enfim. E isso faz uns dois anos. Como
ela se chama? Ah! Maria de Lurdes (a Malu). O nome provém de uma personagem
criada pela escritora Talita Rebolças, obra que minha outra filha estava lendo
naquele momento.
Bom, o tempo passou. Hoje,
de tão faceira, a chamamos, também, de Maluca, uma vez que não se preocupa mais
com os sadismos de ‘bons cristãos’. Reaprendeu a se eternizar, mesmo que alguns
hematomas nos lembrem do contrário.
Quanto a ela? Deve nem saber daquela pequena morte, acho que esqueceu! É
o que espero!
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