Desde pequeno,
geralmente no mês de janeiro, sempre embarcávamos para a praia. Naquele tempo,
quando garoto, as excursões ganhavam estradas mais distantes e sofisticadas –
eram organizadas por conhecidos de meus pais (e pena: estranhos a mim); hoje,
não tão ambiciosas, as viagens receberam um ‘quê’ pouco mais familiar, pelo
menos no que se refere à proximidade. Sim, financeiramente tornaram-se menos poderosas,
confesso. Contudo, o tempo curto de estadia se alonga mesmo é pelos abraços de
bons braços de pessoas que convivemos na vida. Quero dizer: companhias pouco
mais lúcidas para cada um de nós.
Assim foi o mais
recente dos passeios...
Passada a jornada e já
no litoral, alguns aproveitaram o banho de mar; outros, a areia, as partidas de
bocha, o frescobol e os pontos locais de caipirinha (porque ninguém é de ferro);
enquanto isso, determinado grupo foi logo bater pernas pelo centro da cidade. Pois
é. Desassossegado, ‘caronei-me’ no terceiro (os batedores de pernas) e,
chegando lá, esperei com paciência enquanto minhas filhas escolhiam seus
suvenires. Crianças esticam o tempo, mas percebemos em seus olhos que tudo não
passa de um flash, de tão ligeiro. Só que também tenho outra maluquinha em
casa, uma leitora, e dando mais uns passos, pronto, encontramos nosso oásis:
uma pequena livraria. Está certo, temos livrarias em toda parte, porém, no
espírito dali, entrei procurando suprir aquela fome de “precisar folhar”.
Nessa fuga, observando
os títulos, minha menina e eu, acabamos encontrando um vendedor bem faceiro do
tipo contador de histórias, vendeiro muito legal. Ali ele nos mostrou tudo, parecia
conhecer cada livro, cada gosto, quando... “Olha pai, quero este!” “Claro,
filha!” E sobre uma estante alta, bem acima dela, observei uma caixa. “As mil e
uma noites? Não acredito”. “Sim, estou lendo” – e sacou o primeiro daqueles
quatro volumes, não o embalado, mas um seu. “Passei anos procurando esta obra,
meu amigo. Esta aí agora é minha”. “Pode pegar, te dou de presente.” – vozeou por
entre as falas, minha esposa. Pronto! A filhota saiu com o seu, e eu com o meu embaixo dos braços.
Passeamos mais um pouco
e, já na pousada, comecei minha leitura. Ah, não acreditava que a ‘coisa’ era
bem maior do que havia previsto. O artigo inicial do primeiro dos quatro livros
demostrou o tamanho do mundo que eu estava por adentrar. Ao mesmo tempo em que
acompanhava aquelas linhas, uma paixão ia me assolando. Fui lendo como se
estivesse faminto. Entendi/senti o desespero do rei Sãhriyãr por conta da
traição de sua mulher. Sentei-me com os dois, com ele e com Sherazade e...
Nossa! Tudo pareceu tão perto e real. Uma pena que estava cansado da caminhada, e cochilei...
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(...vi aproximar-se um Gênio terrível. Subi apressado
em uma árvore. De uma caixa que carregava a sete chaves, saiu
uma mulher. Estavam bem abaixo de mim. Desencaixando-a, ele dormiu. A moça, em
seguida, me pediu para que a desposasse ali mesmo, do contrário, convicta, acordaria
o monstro para me matar. Fiquei assustado e não pensei duas vezes. Fiz...)
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“Dormindo, Dilso?!”.
Todos haviam retornado
da praia. Pus um marcador na página, e respondi: “Vou caminhar um pouco,
está quente aqui, não?!” – e fui mesmo, sorrindo por ter me dado conta de ter
se tratado de um pesadelo mestiçado por aquela ficção.
“Que sonho!” – pensei.
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