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quinta-feira, 7 de janeiro de 2016

A PRAIA DAS MIL E UMA NOITES: UMA CRONIQUINHA DE VERÃO

Desde pequeno, geralmente no mês de janeiro, sempre embarcávamos para a praia. Naquele tempo, quando garoto, as excursões ganhavam estradas mais distantes e sofisticadas – eram organizadas por conhecidos de meus pais (e pena: estranhos a mim); hoje, não tão ambiciosas, as viagens receberam um ‘quê’ pouco mais familiar, pelo menos no que se refere à proximidade. Sim, financeiramente tornaram-se menos poderosas, confesso. Contudo, o tempo curto de estadia se alonga mesmo é pelos abraços de bons braços de pessoas que convivemos na vida. Quero dizer: companhias pouco mais lúcidas para cada um de nós.
Assim foi o mais recente dos passeios...
Passada a jornada e já no litoral, alguns aproveitaram o banho de mar; outros, a areia, as partidas de bocha, o frescobol e os pontos locais de caipirinha (porque ninguém é de ferro); enquanto isso, determinado grupo foi logo bater pernas pelo centro da cidade. Pois é. Desassossegado, ‘caronei-me’ no terceiro (os batedores de pernas) e, chegando lá, esperei com paciência enquanto minhas filhas escolhiam seus suvenires. Crianças esticam o tempo, mas percebemos em seus olhos que tudo não passa de um flash, de tão ligeiro. Só que também tenho outra maluquinha em casa, uma leitora, e dando mais uns passos, pronto, encontramos nosso oásis: uma pequena livraria. Está certo, temos livrarias em toda parte, porém, no espírito dali, entrei procurando suprir aquela fome de “precisar folhar”.
Nessa fuga, observando os títulos, minha menina e eu, acabamos encontrando um vendedor bem faceiro do tipo contador de histórias, vendeiro muito legal. Ali ele nos mostrou tudo, parecia conhecer cada livro, cada gosto, quando... “Olha pai, quero este!” “Claro, filha!” E sobre uma estante alta, bem acima dela, observei uma caixa. “As mil e uma noites? Não acredito”. “Sim, estou lendo” – e sacou o primeiro daqueles quatro volumes, não o embalado, mas um seu. “Passei anos procurando esta obra, meu amigo. Esta aí agora é minha”. “Pode pegar, te dou de presente.” – vozeou por entre as falas, minha esposa. Pronto! A filhota saiu com o seu, e eu com o meu embaixo dos braços.
Passeamos mais um pouco e, já na pousada, comecei minha leitura. Ah, não acreditava que a ‘coisa’ era bem maior do que havia previsto. O artigo inicial do primeiro dos quatro livros demostrou o tamanho do mundo que eu estava por adentrar. Ao mesmo tempo em que acompanhava aquelas linhas, uma paixão ia me assolando. Fui lendo como se estivesse faminto. Entendi/senti o desespero do rei Sãhriyãr por conta da traição de sua mulher. Sentei-me com os dois, com ele e com Sherazade e... Nossa! Tudo pareceu tão perto e real. Uma pena que estava cansado da caminhada, e cochilei...
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(...vi aproximar-se um Gênio terrível. Subi apressado em uma árvore. De uma caixa que carregava a sete chaves, saiu uma mulher. Estavam bem abaixo de mim. Desencaixando-a, ele dormiu. A moça, em seguida, me pediu para que a desposasse ali mesmo, do contrário, convicta, acordaria o monstro para me matar. Fiquei assustado e não pensei duas vezes. Fiz...)
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“Dormindo, Dilso?!”.
Todos haviam retornado da praia. Pus um marcador na página, e respondi: “Vou caminhar um pouco, está quente aqui, não?!” – e fui mesmo, sorrindo por ter me dado conta de ter se tratado de um pesadelo mestiçado por aquela ficção.
“Que sonho!” – pensei. 

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