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terça-feira, 23 de fevereiro de 2016

DEDOS PELADOS, PÉS ENCHARCADOS...

Pois então. As férias acabaram. A vida precisa seguir aqueles fazedores de caminhos, que são os pés. Para eles já bastam de bacias cheias de água morninha e sais preguiçosos. Quanto aos seus companheiros, os dedos, eles, mais do que ninguém, precisam deixar de lado a nudez das chinelas fios-dentais e calçar o bom e velho all-star – ah, e como esses ordinários gostam de andar pelados! Às vezes até os censuro: “Controlem-se, rapazes! Assim é demais, pô!” Mas não há ouvidos, restam “olvido” (no sentido de esquecimento). É. Eles me ignoram mesmo. Parece não saberem que é hora de apertarem-se dentro dos tênis e porem-se no chão. Porém, espertos como são, desconfio que fazem-se é de ‘dessabidos’ de suas obrigações. “É bom que se vistam logo, minha gente!” – reclamo outra vez – “Precisam ajudar no equilíbrio dos passos. Quanta enrolação! É importante. Vamos logo!”
Verdade, eles me dão um trabalhão. Nossa, e como são teimosos, esses meninos! Acostumaram-se fácil ao descanso do ‘nada-pra-fazer’. Acho que é por isso que ultimamente os horizontes parecem desorientados. Os pés é que lhes tiram à embriaguez das distâncias, cavam pegadas neles. E se os bonitos estavam embaciados e os dedos fazendo-se de surdos e descansados, não há distância que possa existir para o restante do corpo, sobretudo aos olhos. Mas deu. Vou forçá-los, uma vez que se continuarem assim daqui a pouco estarão virando raízes. Vamos lá, gurizada! Não sou árvore. O mundo chama. Bora! Bora!  
Sim, vesti-los é como vestir bebês. Ponho até talquinho. Depois enrolo uma meia, ponho em um; outra, ponho noutro. Os tênis vêm depois. Querem correr. E pensar que foram eles que me obrigaram a comprar tantos all-stares. Bom, eu gosto!
Enfim, sem alternativas, tenho um pedido:
“Queridos pés e amigos dedos, chega de esconderem-se em um cruzar de pernas. Sabem que faço isso enquanto leio. Preciso disso para sair ao longe de dentro de mim mesmo. Desculpem se para isso não precisei de vocês. Contudo, agora preciso. Preciso que andem e façam uma estrada bonita para nós. Entendam o seguinte, o período de férias acabou e, se ainda estão cansados, alonguem-se, há muitas distâncias a serem percorridas. Saibam que enquanto relaxavam na bacia e desfilavam peladões, fiz trabalharem os olhos e os dedo. Só que neste momento preciso que não desistam de mim. A vida chama. Levem-me daqui. Difícil, eu sei! O que me dá a vocês outro motivo para não sossegarem. Querem atrofiar? Venham, tracem os caminhos que só vocês sabem desenhar. Prontos? Então vamos lá...” 

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