.

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2016

FALTAM LETRAS...

Há dias em que fico observando os detalhes das pequenas coisas. Nem sempre tudo me vem na hora, preciso escrever para reavivar os vivos daquelas cores da primeira vez. Portanto, deixo os dedos revelarem as fotografias de minhas memórias. Umas recentes; outras distantes; e aquelas enfeitadas pela invenção de meus textos. Todavia, os olhos é que fazem a parte mais fácil: capturar. Já os ouvidos, estes sim cutucam as vistas para o lado que apresente melhor foco, uma melhor luz. As mãos, por sua vez, são responsáveis pelos roteiros, ou melhor, pelos pós-roteiros, uma vez que a vida só se faz ao viver. Isso mesmo. Escreve-se tudo depois. Exatamente como o inverso do cinema, minhas “escrevinhações” funcionam assim: com a direção de uma cena às avessas, que acontece primeiro para só depois ser roteirizada.  
Credo! Acaba de se soltar a tecla “E” aqui de minha máquina. Outro dia foi a “A”, mas arrumei. O que torna difícil este retrato. As memórias vêm e vão muito rápido e que falta faz um “E” ou um “A” na composição. Não poderia um “K” me abandonar? Este sim desgasto menos, acho que não tenho nenhuma boa recordação que se desenhe com ele. Bom, de qualquer maneira, ando mais devagar. Saquei o botão e agora me perco em palermices vagarosas capengadas pela falta do meu querido “E”. Logo hoje que gostaria de fotografar a minha filha (a Eduarda) neste, que se tornou, um penoso pós-roteiro de perna quebrada. Mudo de foco. Pois, assim como eu, meu computador parece estar ficando velho. Melhor falar de velhice, então. Vamos lá!
Onde eu parei mesmo? Ah, sim, sobre estar ficando velho como meu teclado. Bom, pensando nisso, sinto que o tempo, às vezes, sopra ventos redondos. Redemoinha sobre nossas cabeças e leva alguns escuros da cabeleira da gente... Minha avó tinha razão quando gritava: "Já pra dentro, guri! Redimunho na rua é poeira que o diabo arredonda para nos prendê na soltura de dia santo! Deusulivre!”
Ah! e hoje tudo isso me parece tão ontem...
Pois então. Tecla quebrada. Irritação da idade... Quando ficamos frustrados não é muito bom ficar olhando pela janela. Parece que ela nos pensa, e esses pensamentos são perigosos. Funcionam como vaga-lumes assanhando-se para a noite (e sempre à noite...). Se de dia não os vemos, é porque precisam de escuros para melhor iluminar os ‘ali-por-dentro-da-gente’. 
Num desses dias de vento, inclusive, estive pensando. “Ai que medo de ficar velho. Medo de esquecer, de morrer. Acho que vou deixar minha esposa ciente de onde guardo meus arquivos. Assim, em um futuro (espero que) distante – quando meus dedos estiverem já mortos –, talvez ela possa publicá-los nas “tijolações" de em um livro, porém sem o peso de meu receio, caso nunca se venda nenhum. Mortos tornam-se bons (quero tirar proveito disso), mesmo que nas bolinhas barrocas dos rosários que são cantados, apenas, nos funerais. Está certo, depois, naturalmente, sei também que se desfiarão a rolar, junto conosco, num tempo breve de espalhar lembranças. Contudo, quero tentar isso antes de ficar vagalumeando até, aos poucos, ser esquecido nos escuros do pó de onde voltarei a poeirar vazios.” Então, só então percebo que não sou eu que vario, é o tempo que me varia – nos varre.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Divida conosco suas impressões sobre o texto!