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segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016

QUANDO UM HOMEM AMA UMA MULHER QUE NÃO EXISTE...

Encontro milhões de vozes arredondando o universo, inclusive as minhas. Mas o engraçado mesmo é ser encontrado por uma voz quadrada, inquieta. Ah, gente! Difícil ter que afirmar (quando falamos, as palavras dão formas ao que pensamos, elas viram monstros de corpo e tudo o mais), porém preciso dizer, perdoem-me os otimistas: sim, há momentos em que estamos tão exaustos de tudo que até o nada nos parece cheio, daí ficamos ouvindo, e ouvindo, e ouvindo... E os ouvidos – coitados – ficam girando dentro daquela barrigona que o “sem-assunto” engravida.
Bom, neste instante, acredito que o leitor já não aguente mais. Claro, quer saber quem é essa mulher que não existe e o porquê desse título tão platônico. Pois digo. Ela existe sim, acabou de encontrar meu corpo em uma daquelas gorduras que te falei. Só que ao invés de uma gravidez, me fez parir algumas emoções.  
Bom, explico melhor:
Como eu já disse, há vozes que nos encontram. Cansado das paredes e do calor de estar lá fora, um sábado me tragou. Peguei uma cerveja, misturei com um livro da Clarice Lispector e fomos conversar. Surpreso com tamanha mestiçagem? Pois saiba que ambas possuem maneiras distintas de embriaguez, juntas descobri um ópio bem baudelairiano, enfim. E assim que acabei de ler, senti que uma paixão dessas de adolescentes havia me enquadrado de jeito – então, sofrido, escrevi o seguinte:
“Acabo de ficar bastante chateado ao terminar de ler uma obra que outro de mim já havia lido há uns quinze anos. Este último, confesso, sofreu mais, amou mais, sentiu até os ossos os sofrimentos da moça Macabéa (personagem de "A hora da estrela", de Clarice Lispector). Mulher de pouca existência, nordestina sem rumo e que mal sabia que podia, como todo mundo, chover, chorar... Sim, hoje sofri, não pela leitura, mas com a sensibilidade dos dedos que criaram essa criatura torta, mas tão torta que a vida dela foi me descendo como cubos de gelo – uma novidade para os redondinhos que deixam preguiçosos os nossos sentidos.”
“Ah! Tarde bonita, noite perfeita, mesmo que tristonha, na companhia dessa obra-prima... Ainda não leu? Então não leia, vá dormir. Por hoje basta, já chega eu ter me apaixonado por esse fio de pessoa que, por não existir, acabou por me fazer mais existente.”
“Boa noite!”

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