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terça-feira, 22 de março de 2016

LIVROS DE PRESENTE E UM SUPER-HOMEM DECADENTE

Bom, dá para imaginar um presente melhor? Eu mesmo, geralmente em um impulso involuntário, acabo sempre caindo no abismo de ter que dar um livro que gosto a alguém. Sabe, acho que não somos nós, mas eles que volta e meia resolvem mudar de rumo e de casa. O que não considero um total abandono, já que uma vez lidos acabam morando para sempre ali por dentro da gente – seus desassossegos desassossegam outras partes e assim nunca mais nos deixam sossegar.
Quando era criança, por exemplo, tinha um pouco de raiva em ganhar roupas (ainda não conhecia os livros). Nossa! Naquele tempo queria mesmo eram brinquedos, ora! Por que ninguém entendia isso?! A coisa toda era tão bem vestida que, arrumadinha, sempre respeitava a seguinte ordem: no Natal, roupas; na Páscoa, roupas; no aniversário? Adivinha. Sim, acertou. Roupas. Não, nada de bonecos ou carrinhos de fricção. Mesmo assim confesso que me sai bem, ao menos tinha certa fertilidade na imaginação, certa nudez. Pegava uns prendedores de roupas, abria-os ao meio... e eis que surgiam bonequinhos carregando mochilas atômicas. Minha mãe desaprovava, claro. Afinal de contas, prendedores são para prender as... Adivinhou? Pois é.  
Contudo, já fui bem mais ousado. Certa vez encafifei que era o Superman. Tirei a roupa, pus uma cuequinha vermelha e, com uma camisa do meu pai abotoada no pescoço, saí pelo mundo a voar. Só que eu não estava satisfeito. Para provar que minha visão era também de raio x, pus uma venda nos olhos e comecei a andar. O objetivo era virar certinho na entrada de casa. Pena, um pouco antes havia um esgoto, na época, a céu aberto e – entre outras coisas (muita bosta) – cheio de cacos de vidro. Caminhei, caminhei... e puf! Acordei horas depois dentro de uma bacia. Que vergonha, o Super-Homem acordara pelado na frente de uma meia-dúzia de curiosos enquanto sua mãe o lavava por causa da sujeira e do sangue. É, meus amigos, desmaiar é como morrer, desligamos mesmo! Bah! Até hoje, toda vez que olho para o espelho, lá está ela: a cicatriz do corte bem no meio da testa do homem de aço. Nem preciso dizer que resolvi deixar essas coisas para os quadrinhos e para o cinema, há dublês por lá. Decidi que era mais seguro.
Mas cresci e descobri que não precisaria mais me quebrar tanto para voar ou enxergar através das coisas. Ao ler o primeiro livro, passei a observar o que havia de errado em mim. Nada, ué? Apenas queria voar. O que têm de errado nisso? Nas palavras estava tudo o que precisava. Não havia mais necessidade de quebrar ossos. Dali para frente passe a ler como um louco, agora, cheio de lucidez... Li, e li, e li... até encontrar a poesia. Ah! Então aquele mundo afora se tornou cheio de lonjuras e, inclusive, até nos cricrilos dos grilos já podia vislumbrar um motivo para relembrar dos tempos em que me encontrava sozinho com meus prendedores atômicos. Tudo me clareou. Incrível, o bem que isso me fez também me move a presentear pessoas que considero malucas e que, exatamente por isso, tenho admiração. Roupas não. Livros. Pois só eles é que sabem nos vestir por dentro, que é onde importa mais. A moda não está em ovos de chocolate ou em ricos vestuários embrulhados em grandes caixas debaixo de um pinheiro de canto de sala.  A moda é dar livros de presente. Sim, livros mesmo! Uma vez que são brinquedos, e quem sabe brincar direitinho com eles está na moda, fica sempre no melhor estilo do "consigo-mesmo".
A propósito, não me importo em ganhar livros. A não ser que me queira ver quebrando a cabeça outra vez... Quer? Não faria isso comigo, não é?
Fica a dica!  

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