Na tentativa de provocar alguma claridade, a alma
sempre me põe a escrever. Bom, acho que não sei mais pensar a não ser pelos
dedos – preciso que eles catem, um a um, os milhos das letrinhas que vão me
faltando para completar certas ideias escuras (e até obscuras) que desaprendi a
iluminar sozinho. Às vezes, inclusive, – o que é bem interessante – sinto até
que minhas mãos se parecem com duas galinhas, pois quando o terreno está sujo
ali nas interioridades, elas ciscam e ciscam, até tudo ficar limpinho. Em
seguida vêm os espíritos do dia (parecem que esperam pelo momento certo) e lhes
jogam alguns punhados de grãos. E se acompanhou a imagem que produzi até aqui,
sei que não preciso mais gastar palavras para explicar o processo que está me
levando a estar neste texto, uma vez que a esta altura já deves saber dos que
servem de bicos para minha dupla de meninas de penas – as aves “voadeiras” do
chão (as mãos).
Enfim, há dias em que ficamos inquietos por conta de
um monte de coisas que precisamos fazer ao mesmo tempo. Gosto disso. O
desassossego é bom. Contudo, humano que sou, faltam-me elementos para completar
algumas vontades claras que ficam às sombras do que preciso dizer. Se quiseres
saber mesmo o que levou minhas meninas a ciscarem por aqui, então digo: foi o
fato de que estive pensando sobre a melhor forma de abordar o Simbolismo na
Literatura, para meus alunos. Complexo, admito. Gostoso, confesso. No entanto,
para jovens menos pacientes, falar em Baudelaire me pareceu estranho para
começar, sobretudo se abordar as origens do tema (teoria), que encontra suas raízes
em outros poetas e articulistas franceses. Mas – ufa! – para minha sorte,
enquanto os bicos de minhas galinhas catam os grãos por aqui, pensei na poesia
pura para iniciar a discussão, já que minhas aves andam a me servir de símbolos
para este terreiro todo de dentro de minha cabeça.
Sim, meu amigo! Acho que começarei pelo coração. E
não me venha com piadinhas de que também curte um coraçãozinho de frango no
espeto. Não falei em espetos, sabe disso! Só não vou seguir a teoria de
imediato (pesado), farei o inverso. Vou expor logo dois poemas: um de
Baudelaire (“O albatroz”, da obra “As flores do mal”); outro de Cruz e Sousa
(ainda não decidi qual). E não, não os exponho aqui, falta espaço para tanto. Além
de tudo, só vim mesmo foi para pensar. E como a terra está limpa e já posso ver
o desenho que os milhos fazem pelo chão, me vou.
Ah, só lamento que minhas galinhas não ponham ovos,
também! Na certa que seria agradável comemorar esta lucidez desembaraçada com uma
boa omelete. Estéreis que são, venham aqui amiguinhas, deixe que eu lhes sirva
de ninho. Agora descansem...
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