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sábado, 11 de julho de 2015

(G)ATOS

O que me falta em espíritos quem supre é o gato.

Não imagino companhia mais agradável. Mesmo quando meus silêncios estão secos – às vezes nem os ecos desejam abraçar as pedrinhas lançadas ao rio –, lá vêm eles para tornar o ar pouco mais respirável. A “umidade relativa do ar”, como querem alguns meteorologistas, consegue chegar exatamente quando eles chegam. Um molhado invisível, leve, silencioso e, para mim, necessário. Será que funcionam como condicionadores de ambientes?
Há algumas horas, humano que sou, andava triste e cheio de pensamentos ruins (venenos que volta e meia produzimos e entornamos feito vinho). Momentos embriagados fazem o tempo cambalear assim, tal como chute em bola murcha, bola que nos fica presa no pé. Raramente perco os espíritos para essas distâncias, confesso, mas quando perco, não fico, meus gatos não me deixam perambular muito por esse limbo. Vou com eles, abandono meu deserto e acompanho as sete vidas de cada um dos bichanos. Desintoxico.  
Dizem até que, no escuro, os gatos enxergam de 6 a 8 vezes melhor do que nós, mulheres e homens. Mesmo assim – e isso é curioso – são extremamente confiáveis, pois, indiferente desse poder todo, sabem nos avaliar muito além do que parecemos aos seus olhos. Leitores fabulosos, esses bichanos. Os daqui, por exemplo, parecem que farejam quando resolvo preparar os temperos para uma possível cicuta. Aparecem, pulam no colo, olham e depois saem, deixando para trás fantasmas que dizem assim: “vêm conosco, nós te salvaremos!”. Nossa, é um sofrimento em dois Atos. I: a melancolia; Ato II: a lucidez. Bom, pelo menos sinto assim!
Pois então, o gato é ou não é um ser mais magnífico? Penso assim porque além da destreza, da personalidade sincera e dos ânimos autônomos (se maltratá-los não voltam a te olhar), ainda são eternos por não fazerem conta de sua própria morte, não futuram o presente pensando no próprio fim: só os silêncios lhes são caros, só os silêncios vivos e sentidos em um tempo qualquer de algum de seus 'agoras'. Vai ver que é por isso que são tão pouco queridos pelas pessoas: não são submissos, nem barulhentos. Ou eles amam ou te deixam. Negam-se a gastar suas vidas rodando em bajulações vazias. Sim, os gatos são investidores. Contudo, e é o que nos assusta, eles nos fazem lembrar alguns de nossos espíritos mais atávicos, instintivos e recônditos – e isso inquieta, nos incomoda. Ainda bem! 


Enfim, acho que estou melhor. Nada como ter em casa dois purificadores de alma. 

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