Quem escreve costura vozes, amarra imagens e tece
com elas uma grande coberta que nos (des)cobre.
As palavras nos sondam,
nos trazem para fora, nos expõem e nos desarmam. Tudo nos escapa. Nada sabe ser
silêncio, tudo se vai – mesmo quando não queremos que vá. As palavras nos
tornaram incompetentes para existir: elas é que nos existem. São anjos atletas,
usam as próprias auréolas para treinar arremessos com nossas cabeças. Nenhuma
deve ficar presa. Contidas, vão se tornando vozes que te acompanharão até os
infernos. Quanto mais demorar a libertá-las, mais forte ficarão quando saírem –
cedo ou tarde elas sempre saem, viram monstros. É certo, uns possuem o dom
(mesmo que não acreditemos em dons) de organizar todos os sons em cores;
outros, menos populares, em silêncios. Acho que pertencemos ao último. Por isso
escrevemos, mesmo sabendo que cada palavra precisa ganhar tom em alguma voz, mesmo
que se perca pelos cantos.
Quando escrever? Ora! Sempre
começamos na hora certa, porque a hora começa agora, não deixa cauda, não
mostra fim. Os relógios não sabem de nada. Os tempos, para fora deles, estão
sempre prontos para novas multidões, para crescer. O mundo não diminui quando
crescemos. Ele encolhe quando a poesia (que é elástica) cansa sua borracha e dá
lugar à rotina, que, por sua vez, aperta nossas crianças. Sim, a
escrita é que mantém organizadas as vozes de nossos pensamentos. A caneta deve
ser como uma artéria. Quando o coração bombeia, suas tintas nos (ex)pulsam para
o papel.
Claro que nem sempre somos entendidos. A
comunicação não pode ser entendida apenas como participação. Fazer parte de
algo nem sempre quer dizer estar comungando com o todo. Contudo, o participante/leitor
– se bem afiando – é quem ajuda a harmonizar a canção, pois temos muitas vozes,
somos muitos, mesmo que só um dos de nós é que segure a pena, mergulhe-a nas
tintas para sangrar no papel.
Por fim, acho que o
mundo promoveu os escrevinhadores a arisco, medrosos que se escondem nas
próprias entranhas. Ainda bem que, volta e meia, seus espíritos se vazam pelos
dedos, desafiam-se para além das carnes e se reescrevem em abismos forasteiros.
O que lês são meros cacos, limalhas caídas daqui, dali. Junte-as todas, se
possível, e refaça todos eles com um pouco de ti. Não permita que alguma ‘escrevinhação’
siga quebrada neste escuro interior: leia!
É, acho que escrevemos
para tentar existir, para existirmos um pouco em você...
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