O amor vira madrasta ao nos perceber
para fora de seu reflexo. Espelhos são frágeis, não negam beleza a quem os pode
quebrar - só que não somos espelhos.
Hoje, enquanto
retornava para casa, fui observando cegamente o mundo – meus olhos se voltaram
para dentro, para as memórias. Tomado pela trilha sonora do filme Cinema Paradiso, composta pelo maestro
Ennio Morricone, acabei saindo dali. O carro até parecia me dirigir, ao invés do
contrário. Bom, acho que entrei no modo piloto automático (e quem não desliga
de vez em quando?). Na estrada, perigoso, preciso dizer. Contudo, naquele
momento, o aleatório do som parou para brincar comigo, fez-me andar, andado
pelo veículo que me conduzia. O automóvel levava meu corpo, meu corpo levava aquela
história que, por sua vez, transportava-a para um ponto inventado de certas
recordações que carrego. Nem sei como cheguei em casa, inclusive. Coisa de
bêbado – eu sei que pensou nisso.
A música me levou para
outro tempo, para um filminho só meu. Pensei, fiz analogias entre a obra e o
que se passa/passou na vida. No filme (o do Cinema), Salvatore se apaixona explosivamente por uma moça, ambos jovens.
O tempo correu. Consegue parar um rio? Pois então, não é diferente disso. Ele nunca
mais a viu. Pobre garoto, sem dúvidas passou a vida apaixonado (o que este “não-ver-mais”
ajudou, e muito, a engordar). Amou uma imagem, ou a senhorita? Sim, ele foi
tocado, e todos são tocados pelos próprios tambores, deve ser isso. Mas e o coração
dela, tamborilou?
Sempre o mesmo: procuramos
o amor, mas encontrar-se nele é que é um achado. Só amamos quando aprendemos,
desaprendemos e reaprendemos a afinar todas as cordas de nossas razões,
ultrapassando aquelas imagens que amamos à distância. Contrário a isso, o que se
pensava amor acaba, pois nos damos conta de que, não sendo uma cópia fiel de
nós, o outro é capaz de existir sozinho, ela/ele não é pueril, ninguém é.
Quebrando o egoísmo, quebra-se o encanto. Mesmo sabendo que ele (o amor) é uma
doença estranha e que não sabemos direito de onde vem. Se do corpo, se da alma,
se da imaginação... O problema é que sabemos muito bem sobre a cura – e o
pensamento sobre a cura, quanto mais profundo, é que nos ‘enfebra’ ainda mais.
Voltando ao que estava
dizendo, os filmes (no que incluo os meus), através da música, me fizeram visitar
um lugar onde só existe dentro de mim mesmo. Se isso tudo aconteceu também para
fora? Sim, algumas coisas sim, o restou tornou-se a mais pura verdade, porque
fui eu mesmo que inventei. E quem nunca
viveu um grande amor?
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