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quarta-feira, 16 de setembro de 2015

O JULGAMENTO DE CAPITU

Não julgueis, para que não sejais julgados.
                                                             (Matheus 7:1).

Gênio. Joaquim Maria Machado de Assis é genial. Digo no presente porque sim, a cada leitura, ele continua a existir – e ainda insiste, com suas bruxarias, em conservar-se no tempo como um Shakespeare só nosso. O mestre, para não deixar dúvidas de sua eternidade, perpetuou uma inquietação que atravessou o século e até ele mesmo (refiro-me a sua parte mortal, a do corpo): “Afinal de contas, Capitu é culpada ou inocente?” Pois então. Alguém sabe? Vou contar sobre o caminho que me percorreu (sim, não errei, o tal questionamento me percorreu mesmo!).  
Acompanhem:
Há alguns anos, – encantado pela literatura machadiana – resolvi reler todos os contos e também os romances dele (só os Realistas, não me perguntem o porquê). Neles, óbvio, algo me chamou atenção: os nomes. E existe até uma nomenclatura para esse tipo de estudo, chama-se onomástica. Difícil, não é? Eu que o diga. Enfim, com isso, percebi que havia um mundo inteiro morando ali, naqueles batismos, e que, a cada personagem que se desenhava, o nome afinava sua personalidade. Querem saber de alguns? Aí vai: “Fulano Bertão” (fulano, BELTRANO, sicrano); também, se observarem com calma, todos os que lembram leão: Leonor, Leonardo... cada qual carregando certo oportunismo felino; “Lucrécia”, do latim lucretia, que significa “aquela que precisa gerar lucro” (sobre uma menina negra que trabalhava para uma senhora, do conto “O caso da vara”); entre outros. Bom, não me delongo, há universos e universos a serem espiados em cada entranha daqueles escritos.   
Está bem, continuando, vou ficar com o que me causou mais espanto, pois, havendo anotado e analisado cada personagem (intuitivamente, claro!), cheguei até o mais evidente, o Dom casmurro. “Bento Santiago, te peguei!” – pensei enquanto abria um sorriso para ninguém ver. “Santo e Iago, hum!”  
Bom, explico: sabendo que Machado era um shakespeariano de carteirinha, vou expor só um personagem dele (do Willian): o Iago, de “Otelo”. Ele (o Iago) é o veneno da obra, fez Otelo matar Desdêmona, sua esposa. Acho que não preciso falar mais. Sabendo que Santo é o oposto de Iago, o que podemos esperar de uma narrativa que é toda descrita por um ser que tem na essência essa mistura? Bento Santiago, homem intrigante! Um Casmurro bipolar que, decepcionado com o mundo, nos faz crer que o amor de sua vida o traiu. Não é à toa que Capitolina lembra capeta, e Desdêmona, demônio. Diadorim, esta foi a diaba cunhada por Guimarães Rosa (esta fica para outro texto). Mas voltando ao assunto. Ah, essas mulheres e seus feitiços infernais! Precisamos cuidar. Todas – cada uma delas – possuem olhos oblíquos e dissimulados. Vide os espíritos tortos e embaraçados de nosso ‘sofrido’ casmurrão.
Julgamento? Mas não precisamos das duas partes para efetuar o embate? Saibam que qualquer bandido tem esse direito. Conseguem citar uma só fala (que não seja das memórias duvidosas de Bentinho) na qual ela revele o que pensa sobre isso? O seu ponto de vista? Ela é a vítima, meus amigos! Claro que não encontrarão o lado avesso, já que a obra toda acontece dentro das recordações de um desconfiado da vida. O lado dela quem conta, ora é o Santo, ora é o Iago. Ambos desafinados pelo tom vitimado daquele Casmurro tão triste.  
Perante a estes fatos, qual seria o seu veredito?  

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