Quero só um caderno, uma caneta e um professor. Isso
me basta para mudar o mundo.
(Malala)
‘Só Eu Posso’ era um
lugar onde as coisas ‘desaconteciam’. Por lá, todos andavam nus – e este
estar-pelado nada tinha a ver com roupas ou sapatos. Nesse aspecto, todos
viviam até cobertos, já que suas vergonhas deviam estar devidamente tapadas. A
nudez estava na falta de palavras. Na grande cidadezinha, a pequenez que a
fazia, logicamente, “inha”, estava no vazio. Livros estavam proibidos. Música,
só as permitidas, nada de hinos ou canções. Havia até um decreto no qual devia
ser extinta toda e qualquer forma de literatura, entendeu-se o perigo que a
arte carregava. Em “Só Eu Posso”, além das roupas, somente se permitiam o uso
de chapéus. No entanto, servia apenas para esconder o buraco que cada cidadão
exibia para si mesmo, pelo menos quando sozinhos. O prefeito, Dr. Loboto Mia,
sabia que o ‘não-saber’ precisava prevalecer. A política do “ocar cabeças”
fazia-se importante. Legalidade que anunciava o seguinte: “todos devem submeter
a si próprio e aos filhos a uma cirurgia corretiva.”
Há muito que ele
(Loboto) andava exibindo sua histórica “salvei vocês”. A ordem teria acontecido
já em seu primeiro decreto, na sempre lembrada implantação: “Professores devem
ser extintos e suas memórias apagadas da existência. As inquietações, estas
madrastas, serão duramente combatidas.” Então, o motivo do iminente implante se
fez claro quando o último educador, segundos antes de ser morto, bradou: “Nós
podemos mudar ‘Só Eu Posso’...” – quando booom!!! Desfaleceu.
Desde então, para o
alívio do prefeito, a paz prevaleceu. Todos aprenderam a viver com pouco,
trabalhar muito e desembolsar mais ainda. As rendas chegaram a um número tão
incontável que foi necessário criar um depósito. Mas onde? Quando um ministro
deu a solução: “Há muitas Escolas, vamos usá-las como paiol.” Acalentados pelo
‘desssaber’, o povo mostrava-se satisfeito com a decisão, uma vez que não
escutavam nem suas desapropriadas barrigas ‘desengordando’ de fome, acostumaram-se.
Contudo, naturalmente,
a desafinação aconteceu. Aquele ensaio sobre a surdez mostrou-se finalmente
completo, virou algo ensurdecedor. O roncar vibrou tão barulhento que foi
ouvido de dentro do palácio do prefeito que, sem tirar o pijama, foi até ao
centro da praça e decretou outra de suas medidas:
“Cidadãos ‘sóeupossenses’,
devido a tanta ‘barulhação’, está decidido. A partir de hoje todos os estômagos
devem ser retirados por motivo de ordem pública. Boa noite!”
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