Quem reza, não é mais do que os que não, pois oração
sem ação não passa de solitário murmúrio.
“Pode nos dar uma
esmola, senhor?” – quando uma cusparada molhou o seu rosto. Limpou com uma mão
e estendeu a outra. “Isto fica para mim, agora pode dar uns trocados para
minhas crianças?” A vergonha (acredito) deve ter invadido os espíritos daquele
homem, ou não. Desconheço o mapa dos ‘por-dentros’.
Eis um episódio na vida
de Irmã Dulce. E não, enganou-se, não tenho religião, minhas preces precedem de
outras verdades, o que não me impede de incitar meus escuros a se acenderem com
luzes assim, como as de Dulce. Costumo, inclusive, dizer (para não provocar
reações negativas) que minha religião está no plural, elas pertencem a todas as
cores. Contudo, reconhecendo, admito que existam pessoas iluminadas e que vivem
para nos trazer esperanças. Citei Dulce (a doce), mas poderia puxar mais
algumas ‘bonitezas’ da memória, já que fui educado em ambiente judaico-cristão
– não que ser solidário seja uma marca cristã, nem sempre é, aqui falo
pontualmente. Por outro lado, como expressou a Madre Teresa de Calcutá, “se é muçulmano, seja um bom muçulmano; se é hindu, seja um bom hindu; se é cristão,
seja um bom cristão.” Estas cores... É sobre elas que me referi ao considerar-me
de todas elas. Escolhi ficar de fora, justo que seja assim, já que sou educador.
Ser um reacionário religioso é como ser um político que prega só partidarismo. Respeita
só os de sua sigla (ou coligação) e nutre o hábito de desprezar os que não são.
Para tanto, usam até a expressão: “Não sou nenhuma Madre Teresa.” Enfim, mesmo
cético, fico apático esse tipo de analogia.
Nelson Mandela, por
exemplo, apesar de ter ficado vinte e sete anos em uma prisão. Assim que saiu,
não quis que o ódio da segregação continuasse o aprisionando aqui do lado de
fora. Pregou igualdade e acerto entre pessoas negras e brancas. Sim, ele era
inteligente, e homens e mulheres inteligentes sabem: biologicamente, pertencemos
a uma mesma raça, a humana; existencialmente, a muitas, cada um de nós é uma
raça inteira de si mesmo. Sabendo disso fica fácil compreendermos que haja um
dia dedicado ao altruísmo (o contrário do egoísmo). Na África do Sul chamam tal
data de o dia do ‘Mandiba’. Apelido carinhoso que deram a Mandela e que, em
leitura aproximada de uma das línguas desse pedaço africano, significa “o pai”.
Engraçado. Outro dia um
amigo me indagou: “Esses haitianos ficam entupindo tudo, por que não ficam no
país deles, pô?” “Mas você não é de origem germânica?” “É diferente.” “Amigo,
eles vieram pelos mesmos motivos que seus antepassados. E não, isso não é
diferente, é só indiferença de sua parte.” Quando, em menos de uma semana,
explode a foto daquele menininho sírio encontrado morto numa praia. A
intolerância não poupa ninguém, mesmo. Quanto tempo mais levará para chegar ao
mundo outra Irmã Dulce, outra Madre Teresa, outro Mandiba, outro Gandhi, outro Luther
King...
Enquanto não chega, é
bom que já comecemos a ensaiar a dança das cores. A religião que não prega, mas
compreende que qualquer arco-íris não se faz com apenas uma cor.
Tenho medo do que não
sabemos fazer sozinhos...
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