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quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

A COR DE UMA BOA CONVERSA


Sempre que posso, vou até a casa de meus pais. Geralmente pela manhã, horário onde o verde de um chimarrão desenrola um tapete vermelho de conversas. Gosto de conversar com eles, pois quando o mundo nos tira em ‘verdades que se esqueceram de acontecer’ (como escreveu Mario Quintana), eles vêm e estendem mais uma tapeçaria: a da sinceridade. Não há termômetros mais precisos. Minhas febres são medidas ali, naquela ‘quentura’ toda de um ‘mate’. A cuia vai passando até as vozes se amarrarem. Assim é: um fio puxa o outro e juntos fazem até do nada uma rede fina de boa prosa. 
Aprendi a conversar mais abertamente com minha família por conta desse chá “amargo”. Enganam-se os que pensam que sou tradicionalista ou que sigo alguma tendência regional do tipo “bairrista”. Negativo. Bebo porque foi assim que aprendi a afinar uma boa conversa com meus “velhos”, estes sim gostam de “tradicionar-se”. Compreendi que precisava entrar em seus mundos e respeitar seus hábitos para que eu parasse de ‘lonjurar’ uma vida paralela a deles. Confesso que preciso disso. Preciso sentir os gostos para existir, pois assim como o café passado em pano me faz lembrar a cozinha de minha avó, a erva-mate engorda uma saudade que ainda nem senti por uma distância que nem sequer se fez: o da partida de uma grande morte. Sim, porque de pequenas a vida está cheia e anda grávidas de mais algumas.
A cor de uma boa conversa – pelo menos para mim – costuma ser verde. Não me refiro à esperança (Sim, pensando melhor, ficamos com ela também!). Falo de uma cuia, uma bomba, uma mão idosa moldando a erva com ela, e uma vontade grande de ser eu mesmo naquele breve tempo de compartilhar. Ao sorver um “trago” de mate para molhar as palavras é como se a língua fosse uma pena e o chimarrão as tintas. Só que os papéis onde escrevemos não são brancos, já há um livro inteiro escrito ali, portanto (para um guri feito eu) é melhor ouvir e ver se aprendo um pouco mais.
Certamente uma pessoa que não viva no Sul do Brasil não entenderá o que digo. Há coisas que precisamos sentir. Não pensem que não “estrangero” dentro de mim mesmo. Sou de fora também. Às vezes até um contrabandista de ideias que são apenas ideias. Como um acarajé, por exemplo. Mesmo sabendo de seus temperos, só saberei de sua textura quando eu provar. “Penso, logo existo”. Neste caso o prato baiano somente existirá se eu pensar sobre ele, então, de certa forma ele existe. Não como sorver um “mate” servido pelas mãos de meus pais. Por enquanto fica no plano das ideias, mesmo.

Gosto da existência dos “velhos”, não apenas os penso, mas os sinto. Bom sinal! 

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