Hoje sonhei com a
adolescência, me senti voltando para dentro de mim mesmo. Sabe aqueles sonhos
que parecem reais? Pois é, são esconderijos do tempo, flores perdidas dentro de
um livro guardado há décadas. O livro era eu. Eram minhas entranhas que se
floriam de passados – só que desta vez reconstruídos diferentes. Universo de
uma confusão onírica que volta e meia nos tocam os tambores, o coração.
Nunca ouvi falar sobre
um sonho que parou e continuou. Aquele sim, da segunda vez voltei de frente ao
rádio toca-fitas de meu pai. Anos noventa. Estive de volta naquele garoto que
já se perdeu nas lonjuras de uma vontade de ser grande. O reencontrei junto com
suas paixões. Explodi bem ali. Ainda posso sentir as sensações que já havia
esquecido. Parece que acenderam um sol aqui dentro. Acordei confuso.
Queria poder contar
mais. Não posso. Há segredos que o mundo e o tempo resolveram calar. Quem sou
eu para voltar de onde não se pode mais retornar. O rio andou, fizemos nossas
escolhas. Crescemos como tanto queríamos e vivemos o que tínhamos que viver.
Não há recortes que possam formar novas colchas. As correntezas nos bateram e
não há mais como revê-las nos atingindo. No sonho é diferente, somos sempre
outros que estiveram lá. Uma espécie de curto-circuito da memória. Uma confusão
de rostos e verdades que acaba se confundindo com essas, dos “agoras”.
Acho que tive sorte.
Sonho acordado algo que proferi no passado. Havia dito que nunca pararia de
estudar. E não parei (nunca conheci alguém que tenha parado de estudar a si
mesmo). O sonho me revelou tantas nuances que nem lembrava mais. Rostos
borrados que tomaram feições adultas a se misturar pelas tintas do tempo. Eu
mesmo não me reconheço mais naquele garoto. Como se os livros que éramos fossem
todos reescritos; fitas rebobinadas e devolvidas à locadora; fliperamas cheios
de dedos para tentar derrotar o chefão e voltar do começo; tempos de gazetear
aulas; e de ter um amor passageiro a cada temporada de alguns meses de férias
de verão. Tempo de recordar.
Sorte que descobri a
literatura e a filosofia. Talvez esteja aí a confusão. Posso retornar na vida,
desde Homero a Mia Couto, mas, nesse meio tempo, vou destemperando os meus. O
inconsciente é mágico. Hoje, por exemplo, acordei deste jeito que me leem,
retornei bobo de passados. Sei que não estou mais nos anos noventa. O que não
me impede de querer visitá-lo, nem que seja por uma grande temporada de um
breve flash de quem dorme e acaba
acordando.
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