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quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

OS JARDINS DE QUINTANA E RUBEM ALVES


Sozinho debaixo de uma árvore, ao acaso, folheio suas folhas e leio, gota a gota, as que vão caindo. Solidão de quem anda por além das palavras – mesmo que seja a escrita a responsável por manter organizadas as vozes de nossas multidões, de nossos jardins interiores.
Admito: as palavras revelam mundos que nem quem escreve vê. Organizações que se constroem pelas nossas mãos, mas que ganham sentidos novos quando atingem as vozes de outros olhos. A escrita é uma experiência bem “sozinhada”, enquanto que a leitura revela-se inteirinha, desde que nascemos. Só nós e ela, porque, como eu gosto de pensar: jamais conheci alguém que não soubesse ler. Não falo aqui dos códigos linguísticos, falo dos verdadeiros sabores que, por ventura, elas (as palavras) podem revelar ou revelar-se por algum dos nossos sentidos. Sempre desconfiei que estivéssemos no mundo para sentir. Meio torto, eu sei! Leio o mundo assim.
Há um poema do Mário Quintana, naturalmente muito bonito (e também muito apropriado que ele esteja em um livro intitulado “A cor do Invisível”), que nos sugere o seguinte: “Todos os jardins deviam ser fechados/ Com altos muros de um cinza muito pálido [...]/ Porque quem mata o jardim é esse olhar vazio/ de quem por eles passa indiferentemente.”  Ah, o nome do poema!? Lindo, não é? Chama-se “Jardim Interior”.
Quanto a Rubem Alves, em “Do amor à beleza”, reproduzo tal e qual está, pois já tirei algumas folhas do poema de Quintana. Adiante sigo diferente, quero que as próximas rosas estejam com as pétalas todas no lugar. Quero que as veja assim. Aí vai!
“Quem é que vem primeiro, o jardim ou o jardineiro? É o jardineiro. Havendo um jardineiro, mais cedo ou mais tarde um jardim aparecerá. Mas havendo jardim sem jardineiro, mais cedo ou mais tarde o jardim desaparecerá. Jardineiro é uma pessoa que pensa jardins. O que faz um jardim são os pensamentos do jardineiro. O que faz um povo são os pensamentos daqueles que o compõe”.
Leia o mundo, dê uma tragada, deguste-o, leia-o mais e profundamente. Seja um jardineiro. Só não deixe que a rotina destrua a beleza toda que está ali – no que completo com as palavras de Alves: “Beleza não precisa ter sentido. Ela salva sem nada dizer.” Perceba os milagres, não só do mundo, mas o de sermos capazes de senti-lo. Repito: nascemos pela pura satisfação de sentir, somos leitores natos.


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