Ainda me lembro de
quando nasceu minha primeira filha, a Eduarda. Recordo do cheiro, das
mãozinhas, de minha atitude ansiosa ao conferir se todos os dedinhos estavam no
lugar, do timbre do choro. Como se esquecer da primeira vez em que conseguiu
soprar um assovio. Aqueles lábios pequenos, os mais bonitos que já vi. Naquele
tempo eu enchia a paciência de meus amigos. Falava de cada sorriso novo. Cada
“boniteza” nos olhos. Nada me escapava. Sabia que a amava como nunca amei outra
pessoa. Sua vida tornou-se a minha vida. Seu nome, este não poderia ser
qualquer um. Vem de um amigo querido, o Eduardo, que mora em algum cantinho de
minhas melhores memórias da infância. Não o vejo desde 1985, mas isso é outra
história...
Nunca haverá nenhum
momento que se repita. Minha filha não se repete. Aos olhos leigos sim, ela
parecerá sempre a mesma, só que para mim... Ah! Lembro-me até dos momentos
pesados. Aqueles em que o mundo parecia um gordo a nos esmagar. De quando trabalhava
o dia todo e à noite ia para faculdade. Mais tarde, quando chegava, ela estava
lá, naquele quartinho apertadinho que dividia espaço com meu velho computador
(não tínhamos muito, tudo era magro, menos a nossa vontade de se querer).
Deitada em sua cama, ela me ouvia. Ali lemos o livro do Exupéry, alguns da
Lygia Bojunga, Ruth Rocha e “Os meninos da rua da praia”, de Sérgio Capparelli.
Como era bonito vê-la dormindo. Parecia tão frágil e delicada. Acho que sonhava
com as histórias.
Mais tarde, como eu já
gostava muito de tudo o que é grego, acabei – de certa forma – influenciando a
pequena. Certo dia, na segunda série, ela escreveu uma história mais ou menos
assim: “Como estava chovendo e a escola era pequena, a professora resolveu
contar o que sabia sobre mitologia, ao chegar à parte em que Atena aparecia (a deusa
da sabedoria, e a favorita da Eduarda), parou de chover. Rapidamente a moça da
historinha dela pegou uma mangueira e molhou toda a janela da sala. Queria
continuar.” Achei bonitinha a forma como descreveu isso. Lembrando que sou pai,
não tente me entender!
Certamente, o que mais
me marcou, e ainda marca, é vê-la caminhar enquanto lê. Não é raro passarmos
por ela absorta em uma nova história. Nestes dias não dou carona. Meu carro não
poderia levá-la para as lonjuras em que está. Prefiro não atrapalhar e
contemplar tudinho naquela breve eternidade em que se pinta um momento único.
Sim, estou fazendo
apologia a minha criança. Entendam, sou um pai doente. Sofro de uma faceirice
no espírito esquerdo e que não tem cura nem salvação: a “corujice”.
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