Não posso ler mais
crônicas, elas me inspiram. Daí fico escrevendo como um louco, ‘cronicando’,
'poemando'. Assim, obstinado pelos "dentros", acabo esquecendo-me de
viver para fora. Que doenças doidas essas que tenho: a de existir para as
letras; e a de sentir prazer nisso. Contudo, quando mais me esvazio, mais me
encho; quando não escrevo, leio; quando não leio, escrevo. É, acho que nasci
torto!
Dizem que só
nascemos de fato depois que nos darmos conta de que existimos, quando pensamos
nossa existência. Acho que Descartes tinha certa razão em seu “penso, logo
existo”. Não, meus caros, as pedras não pensam, elas estão ali, existindo,
porque você as faz assim. Tu pensas sobre ela, logo ela está lá, e existe. Tudo
é assim. Só para as crianças as coisas existem mais profundamente, basta uma
única vontade de fazê-las, de trazê-la à existência, e pronto, elas ganham vida,
cores e voz. Já li muitas pessoas que se vestem como meninos para escrever: Mia
Couto, Ruth Rocha, Sérgio Capparelli, Lygia Bojunga e, entre outros, Manoel de
Barros.
O primeiro (o
Couto) brincou com os silêncios, disse que eles eram “música em estado de
gravidez”. A segunda, até onde eu sei, trouxe os clássicos da literatura para a
mais bonita das verdades: a da infância. Capparelli nos fez/faz visitar os
garotos que já fomos. Lygia é a moça que sabe tirar um universo inteiro de sua
bolsa mágica amarela. E Manoel, o poeta “ameninado”, levou muita água na
peneira por acreditar que a poesia surgia quando um menino errava na gramática.
Sim, todos uns tortos na vida!
Claro! Entendo os poetas-meninos(as),
pois o tempo sentido pelas crianças é o mais sabido, pois ele permite que elas
explorem cada cantinho de seus 'agoras'. Ah, a rotina escurece muitos desses
nossos lugarzinhos! Ela não mastiga, não deixa os sabores na boca, ela nos
engole e ainda nos quer certos de uma "maturidade" esburacada e cheia
de 'amanhãs' insípidos e cegos.
Ainda bem que temos os
poetas e as crianças para esticarem os dias pra nós. Sem eles (no que incluo a
música) a vida, certamente, seria um baita de um erro – ou, na menor das
perdas: breve, magra, pálida, doente e RETA.
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