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quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

A LITERATURA NÃO SERVE PARA NADA...


Sempre ao iniciar o ano letivo, um e outro aluno me pergunta: “Para o que serve a Literatura?” Sim, até poderia responder de forma mais prática, mas prefiro a verdade – ou um das muitas verdades que há: “Não serve para nada além de inquietar. Toda a arte é uma grande inquietação.” “Vamos aprender a ler livros?” “Vocês já sabem fazer isso!” “Então o que estamos fazendo aqui?” “Estão aqui para aprender a sentir.” (Quando alguém, geralmente o que senta bem lá no fundo da sala, questiona). “Ora, sentir...” “Não, meus caros! Decodificar códigos gráficos (as letras), isso já sabemos. Agora quero ver o que podem fazer com elas, e não estou falando do ‘be a bá’. Os mecanismos sensoriais é o que importam por aqui.’”  
É notório que ninguém vá a uma peça de teatro, a um museu, menos ainda a um concerto pensando em “como poderia usar isso para o Enem”. Se pensar assim da Literatura, estará matando Calíope (uma das nove musas gregas, a responsável pela arte literária). Saiba que ao aprisioná-la em nichos ‘decorados’ como, por exemplo: Shakespeare pertence à Era renascentista; Miguel de Cervantes escreveu a primeira novela literária conhecida e publicada em 1605; Lazarilho del Tormes foi a primeira obra picaresca da história; Gregório de Matos Guerra, pertence ao Barroco; Alencar, ao Romantismo; Machado dá início ao Realismo no Brasil; e aí por diante.   
Não, meus caros, não nego a importância do embasamento. Mas como posso falar na poesia de Drummond sem nunca ter ouvido uma, sem nunca ter sentido nas entranhas as suas imagens? Por isso sinto-me um arrogante quando me escapam essas palavras: “Ensino Literatura!” Como ensinar algo que não se ensina? Sentir é uma sabedoria que não sabemos que sabemos. Precisamos aprimorá-la e torná-la nossa primeira essência. O exemplo é necessário.  
Pensem, amigos, Calíope não cura a ninguém. Isso pertence ao Asclépio (o deus da medicina). Ela nos deixa apreensivos, doentes da alma, até. Cada letra, palavra e espaços entre os versos de um poema. Tudo isso serve para nos fazer sentir vivos. Nunca encontrará cura para os espíritos, não se trata de autoajuda, mas de demolição e autoconstrução – e não há, segundo Nietzsche, como construir nada sem um pouco de sofrimento. Digo: no início, até que quebre seus vícios e paradigmas, isso pode não parecer bom. O ritmo vai te afinar e te ensinar a ser um perdido no que parecer encontrar. Um amante, um questionador, um cidadão crítico. É o mesmo motivo pelo qual vivemos. Nascemos para pensar e sermos pensados, para, também, existirmos nas coisas, pois se não souber fazer isso, as coisas se coisificam em nada, bem diante de seus olhos.

Enfim, vamos refletir sobre o que queremos que seja a Literatura. Se quiser que me dê respostas boas, aparentemente, não vá à escola, pelo menos não em minhas aulas, fique em casa, leia um livro do Cury ou de outros que fomentem esse tipo de fórmula. Eles é que servem. Não são contemplativos e duradouros. Com o tempo, se deixarem-se sentir pela leitura, entenderão! 

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